ERAMOS FELIZES E NÃO SABIAMOS
O individual e o coletivo desenrolam-se sempre no plano da contingência, por constituir-se em fases sucessivas; e tudo o que acontecer em simultâneo faz oscilar a conjuntura, os aspetos inconscientes da personalidade definem o comportamento, este é aprendido, pelo que o ambiente é considerado fator de organização e configuração daquilo que fazemos em virtude de buscar determinado resultado.
Por outro lado, o isolamento existencial é uma rede de solidão a que se chega de várias formas. A confrontação com a morte ou com a liberdade dá-se por sermos indissociáveis do mundo que partilhamos ainda que isolados, nunca se conhece completamente o mundo, os outros, por maior intimidade que se estabeleça. Segundo Kierkegaard, dado que chegamos a este mundo desconhecendo regras, regulamentos, mas apenas lançados nele, haveremos por ser envolvidos na grande missão da atualidade, ainda que não queiramos. Nas grandes missões ou nas grandes tragédias existe sempre a inquietação do resultado, do melhor caminho a tomar, o sujeito é sempre o herói da própria existência, no acumular de situações, de pequenas tragédias pessoais ou coletivas: no confronto com a morte estará só, qual recém-nascido entrando noutro mundo.
A arte de existir é o equilíbrio incessante, a vigilância atenta, numa espécie de princípio da precaução. E nos grandes temas, quer na área da paz e segurança, quer no domínio da segurança financeira e económica, quer ainda no domínio da escassez de recursos partilháveis, ressalta que o princípio da precaução tem na base o orgulho da capacidade de prever, admitindo a validade da advertência aos que cultivam a prospetiva: a avaliação de factos é sempre um aviso para a responsabilidade de intervir, na esperança de que a consequência corra pelo melhor.
Todos sabem – os que o lerem – a que se refere este texto, mas recuso contribuir para divulgação de um mal que começa por afetar-nos no mais profundo de nós, uma vez que todos sabemos imprescindível o princípio da precaução que nos tolhe o quotidiano, encarcerados no eu, às voltas com o tempo, afastando, qual inseto batendo na vidraça, um fantasma. Isolamento e mais isolamento, numa armadilha das circunstâncias.
2020.3.16
(Data da comunicação radical, porém necessária, de Sua Excelência o Chefe do Governo, relativa ao modo de encararmos a vida, em pandemia, a partir de agora até não sabemos quando. Em emergência, resistiremos: nós, portugueses, somos assim.)