Decorrida uma semana sobre o dia das eleições para as Legislativas, o jogo de xadrez político, em que somos arteiros, continua. Quem afirmará não existir, na intersecção das vozes, apelo de sedução? Acredito que, antes de mais, somos um povo com os genes da atração de antanho, ainda activos, se assim não fosse não teríamos vingado nas escalas pelo mundo fora. Todavia, argumentos inesperados beneficiam alguns, em situação de dúvida; no enredo de vozes e actos alguém haverá de retirar proveito, apesar da manta de recortes partidários mais rebuscada que nunca, para todos os gostos, a teimosia de alguns a desesperar outros; e verificámos que não só a militância se tornou diferente em Portugal, também a intriga política, mais apoiada na astúcia que num ideário seguido à risca.
Como têm sido diferentes as eleições, desde os anos 80... Havia, por essa altura, o culto de figuras, de grandes políticos que o tempo levou consigo: «Olhe que não, olhe que não...!», um certo ardor, a ilusão que, de facto, contribuíamos para a transformação de um país que deixara de ser colonialista havia poucos anos; o partido de Francisco Lumbrales de Sá Carneiro pleno de gente prometedora; Santana Lopes talvez o mais jovem, político de facto político; e alguns outros que se foram acrescentando... e perdendo. Mas, os que vão partindo deixam um vazio que nada preenche; aliás, o tempo, cada tempo, tem o seu modo de exprimir-se, anseios e sonhos.
Vejamos as eleições de 2015 e as de há uma semana: antes do dia de votação, pressupunha-se um determinado gráfico; sofreria inflexão inesperada, Portugal assemelhando-se a uma leira de sonhos, por vezes demasiado optimista: pensar, cansa, substituídos os sonhos por desejos que conduzem à inquietação, à espera a curto prazo... As grandes paixões consomem tempo, vida, e ninguém parece disposto a desperdiça-los. Tudo terá de ser imediato. Em atropelo, reparte-se (ilusoriamente) o poder; durante décadas, demonstrámos persuasão e mérito, além-fonteiras, acolhidos em Bruxelas, labirinto de paixões políticas europeias, americanas, asiáticas ... E quanto conseguimos!
Temos, por sorte, políticos experientes, homens e mulheres capacíssimos que hão-de transmitir, aos que agora chegam à ribalta, algum comedimento; aliás, os próprios jovens políticos, sofrendo o desgaste de emoções e anseios nem sempre realizados, tornar-se-ão mais prudentes. Mas todos fomos já «enfants térribles»; o tempo igualiza, amansa, proporciona sensatez.
Apreciamos o jogo, o arrastar de asa, um não que acabará em acordo, ou o inverso: cultores de um certo masoquismo, temos, na actualidade, a cartilha lida e relida, na certeza de que a invetiva eleitoral deixou de criar a espera assente na ilusão ou num certo tipo de sinceridade de há décadas, em que todos, «verdes no crime», acreditávamos nos mandamentos da democracia; e poucos se atreveriam a desviar-se, cedendo a caprichos. As obstinações - que sempre houve - confinavam-se em acerto, acordo, cedência, jogo este de tal modo entranhado que, se analisarmos a semana que ora termina, não foi abandonado. Tem de haver um certo «frisson», até o inesperado: o Chefe de Estado lança-nos no desânimo, comunicando ao país a possibilidade inquietante de problema de saúde.
Durante uns dias, habituados ao bom relacionamento institucional - não me recordo de algum outro que se lhe assemelhe, apesar de quadrantes díspares - andámos - por mim o afirmo - inquietos, o desalento a insinuar-se. No entanto, exagerámos no cuidado? A História é frágil; temo o efeito das palavras, a palavra dos poderes conhecidos e identificados; nunca falam por falar.
Num Parlamento em que as mulheres terão forte presença, esperemos se empenhem em responder às exigências de dolorosa realidade que vai atingindo os povos, também europeus. A natureza dos governos está sempre ligada à aceitação de povos, experientes em democracia os portugueses, enredados na esperança de um tempo novo, que não terá de ser ridente; bastará a sensatez.
Cumprimento Sua Excelência o Chefe do Governo, Dr. António Costa.