Entre Livros       

Índice:

98 - CANÇÃO PARA AS CRIANÇAS MORTAS

97 - FILOSOFIA DA MISÉRIA

96 - OBAMA NA PRESIDÊNCIA

95 - NOBEL DA PAZ DISTINGUE UNIÃO EUROPEIA

94 - RESILIENCE

93 - ÓDIO

92 - TEAPLOT

91 - VIAGEM DOS AVENTUREIROS DE LISBOA

90 - FERNANDO PESSOA / PROSA DE ÁLVARO DE CAMPOS

89 - A FARSA DO INSTÁVEL

88 - FUNDAÇÂO JOSÉ SARAMAGO

87 - OBAMA ON THE ROAD

86 - O FUROR DA RAZÃO

85 - Geografia do Olhar

84 - ESTOICISMO COERCIVO

83 - O TRAMPOLIM DA LINGUAGEM

82 - NO PAÍS DAS UVAS

81 - ODE À ALEGRIA FUGITIVA

80 - A VIRTUDE DO AMOR

79 - ANGOLA - Metáfora do mundo que avança

78 - Clarabóia

77 - Indignados

78 - APRESENTAÇÃO DE "ORNATO CANTABILE" E "MAR SALGADO"

75 - 11 DE SETEMBRO, 2011

74 - OSLO

73 - Viver é preciso

72 - O grito da garça

71 - MORTE EM DIRECTO, NÃO!

70 - ALEA JACTA EST

69 - CONFRONTO - Porto 1966 - 1972 - Edições Afrontamento

68 - PARVOS NÃO, ANTES CRÉDULOS

67 - DA PERTINÊNCIA & DO ABSURDO

66 - MORTINHOS POR MORRER

65 - VENHA BISCOITO QUANTO PUDER!

64 - VERDADE E CONSENSO

63 - LEAKINGMANIA

62 - SESSÃO DE LANÇAMENTO NA LIVRARIA BUCHHOLZ

61 - UMA APAGADA E VIL TRISTEZA

60 - IMPLICAÇÕES ÉTICAS E POLÍTICAS

59 - NO DIA DE PORTUGAL

58 - FERREIRA GULLAR- PRÉMIO CAMÕES 2010

57 - BENTO XVI - PALAVRAS DE DIAMANTE

56 - O 1º DE MAIO / LABOR DAY

55 - BULLYING E KICKING

54 - O AMOR EM TEMPO DE CRISE

53 - FÁBULAS E FANTASIAS

52 - THE GRAPES OF WISDOM

51 - Do Acaso e da Necessidade

50 - deuses e demónios

49 - CAIM ? o exegeta de Deus

48 - Os lugares do lume

47 - VERTIGEM OU A INTELIGÊNCIA DO DESEJO

46 - LEITE DERRAMADO

45 - Casa de Serralves - O elogio da ousadia

44 - FASCÍNIOS

43 - DA AVENTURA DO SABER , EM ÓSCAR LOPES

42 - TOGETHERNESS - Todos os caminhos levaram a Washington, DC

41 - Entrevista da Prof. Doutora Ana Maria Gottardi

40 - ?I ENCONTRO INTERNACIONAL DE LINGUÍSTICA DE ASSIS, Brasil?

39 - FILOMENA CABRAL, UMA VOZ CONTEMPORÂNEA

38 - EUROPA - ALEGRO PRODIGIOSO

37 - FEDERICO GARCÍA LORCA

36 - O PORTO CULTO

35 - IBSEN ? Pelo TEP

34 - SUR LES TOITS DE PARIS

33 - UM DESESPERO MORTAL

32 - OS DA MINHA RUA

31 - ERAM CRAVOS, ERAM ROSAS

30 - MEDITAÇÕES METAPOETICAS

29 - AMÊNDOAS, DOCES, VENENOS

28 - NO DIA MUNDIAL DA POESIA

27 - METÁFORA EM CONTINUO

26 - ÁLVARO CUNHAL ? OBRAS ESCOLHIDAS

25 - COLÓQUIO INTERNACIONAL. - A "EXCLUSÃO"

24 - As Palavras e os Dias

23 - OS GRANDES PORTUGUESES

22 - EXPRESSÕES DO CORPO

21 - O LEGADO DE MNEMOSINA

20 - Aqui se refere CONTOS DA IMAGEM

19 - FLAUSINO TORRES ? Um Intelectual Antifascista

18 - A fidelidade do retrato

17 - Uma Leitura da Tradição

16 - Faz- te à Vida

15 - DE RIOS VELHOS E GUERRILHEIROS

14 - Cicerones de Universos, os Portugueses

13 - Agora que Falamos de Morrer

12 - A Última Campanha

11 - 0 simbolismo da água

10 - A Ronda da Noite

09 - MANDELA ? O Retrato Autorizado

08 - As Pequenas Memórias

07 - Uma verdade inconveniente

06 - Ruralidade e memória

05 - Bibliomania

04 - Poemas do Calendário

03 - Apelos

02 - Jardim Lusíada

01 - Um Teatro de Papel


Entendo que todo o jornalismo tem de ser cultural, pois implicauma cultura cívica, a qual não evita que, na compulsão, quantas vezesda actualidade, se esqueçam as diferenças.

No jornalismo decididamente voltado para a área cultural, todosos acontecimentos são pseudoeventos, cruzando- se formas discursivasem que as micropráticas têm espaço de discussão.

Não sendo um género, o jornalismo cultural é contudo uma práticajornalística, havendo temas que podem ser focados numa perspectivacultural especifica ou informativa, numa área não suficientementerígida, embora de contornos definidos.

Assim o tenho vindo a praticar ao longo dos anos, quer na comunicação social quer, a partir de agora, neste espaço a convite da 'Unicepe'.

Leça da Palmeira, 23 de Setembro de 2006

        15 de dezembro de 2012



Por Filomena Cabral


CANÇÃO PARA AS CRIANÇAS MORTAS




Entreabro a porta, anseio escutar-vos pela casa.
Mas os vossos rostos brilham nas estrelas

.

No caminho, por momentos, a marca dos seus passos, as crianças deambulam, procuram ninhos, colhem flores,engrinaldam-se para uma festa. Enquanto houver sol, risos musicais juntar-se-ão ao canto das aves. A natureza expande-se, respira em consonância com a desdita ainda longínqua, que também faz parte da melodia.

As crianças percorrem veredas inóspitas, em inocência, intuindo aventura, herdeiras do far west, sentimento indefinido faz-lhes vibrar as narinas translúcidas, por entre sequóias. E vão caminhando: do céu, poeira de estrelas como que cintila em sua volta, as crianças tremem, ansiosas, ainda não sentem medo.

Noutra latitude, crianças percorrem a savana tocando, elementos vibráteis repercutem-se por entre árvores gigantescas: ratos do capim, de olhos minúsculos, contas de vidro, são recolhidos por mãos em concha, quais tesouros, e também elas colhem ninhos, a majestática natureza não as amedronta: filhas de guerreiros, demonstram valentia, enfrentado o perigo com olhar firme, desprendidas da vida quase, sabedoria milenar diz-lhes que a vida é um encadear de tristeza e alegria furtiva, qual corça desenhando arcos, alheia a predadores.

Esperam-nas também, em casa de adobe e capim, colmo, a esteira sacudida, hão de consigo entrar sortilégios, bons espíritos. Cabaça de água fresca aguarda-as, o funge ainda quente na panela: a fogueira, extinto o fulgor das labaredas, perdura em centelhas, quais estrelas despenhadas. A lua quase encobre o horizonte, a terra circunscreve-se à savana.

Do outro lado do mundo, na estepe profunda, trenós vão desenhando mapas de aventura infantil, tilintam guizos dourados, as renas misturam o bafo à natureza gélida. E continuam, em cartografia intemporal, o viver de outras crianças desaparecidas nos adultos em que se tornaram, cujos sonhos lhes foram transmitidos nos ventres das mães. Aguardam-nas estas com taças de chá quente, doces de mel e sementes de girassol: na canção do tempo, entoaram coro épico, reverberante. Decorreu, entretanto, um século, e a utopia permanece, perdura nos filhos dos filhos.


As crianças saíram pela manhã. Quando regressarem trarão em si a harmonia das coisas puras.

Tardam.

Deixaram o mundo.



(Kindertotenlieder- Proponho que escutemos «canção para as crianças mortas», de Mahler, unamo-nos em melancolia, crianças morrem todos os dias e todas as noites, de peste, fome e guerra, por efeitos colaterais, em qualquer latitude, para vergonha nossa. De nada valerá chorá-las.)



Escrito à la minute, o texto acima nasceu de uma necessidade irreprimível, resisto de ordinário à rêverie, por isso abandonei, aparentemente, a Poesia: o mundo dilacera-nos com sorrisos.


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