Conhecemos as variadas descrições, nomeadamente as literárias, da escuridão das cidades, antes da luz eléctrica. Cesário, em “O Sentimento de um Ocidental”, queixa-se: «A noite pesa, esmaga». Das descidas refere a «palidez romântica e lunar». E à medida que «nas frentes» se vão apagando «os candelabros, como estrelas, pouco a pouco» a imagem com que se deparam os seus olhos é tornarem-se «mausoléus as armações fulgentes» Depois assistimos ao entusiasmo, também literário, do esplendor luminoso das cidades, os anúncios deslumbrantes, o néon, de Álvaro de Campos que vê «Platão e Virgílio dentro das máquinas e das luzes eléctricas»; que saúda: «Olá anúncios eléctricos que vêm e estão e desaparecem!»; que observa «Luzes e febris perdas de tempo nos bares, nos hotéis,». Nunca ninguém escreveu com tanta lucidez sobre a modernidade, até dói: «Eia electricidade, nervos doentes da Matéria!». Ele sabia, sabia qual era a nossa doença, irresistível doença, e sabia que um dia nos iríamos confundir com tudo isso: «Eia! sou o calor mecânico e a electricidade!», até à destruição. Não o disse, cantou-o gritando desesperada e entusiasticamente, para que não se percebesse, porque se entendessem verdadeiramente o que ele dizia, tê-lo-iam destruído. Ora não era esse o desígnio. O plano era destruirmo-nos. Está quase a acontecer: «Eia! e os rails e as casas de máquinas e a Europa!/ Eia e hurrah por mim-tudo e tudo, máquinas a trabalhar, eia!/ Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá!». Galgámos por cima de tudo e agora a festa está a acabar, convém começarmos a preparar-nos, e é já tarde, para um regresso à penumbra. Poderá não ser já amanhã, nem no próximo mês, mas vai acontecer. Uma sociedade de conforto e luzes como se tornou a ocidental, terá de ponderar andar pelas ruas escuras iluminadas pela lua, vestir mais um casaquinho dentro de casa, no Inverno. Isto não será um problema grande nos países do sul, mas os do norte terão de se reorganizar, olhar para o passado e reaprender com os avós. O problema é que a floresta já não está próxima, as lareiras tornaram-se decorativas, deitámos fora as panelas de ferro dos avós e os cântaros para conservação da água. Há que reaprender, pelo menos alguma coisa, do que se quis esquecer. E encontrar algum encanto na escuridão da noite e no desconforto da nossa própria Natureza.
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