As mãos procuravam sem saber, ou sabendo bem demais (eu é que não sabia… esta “eu” que não sou as minhas mãos, esta eu que não conheço, que conheço menos que as minhas mãos), procuravam, então, um vídeo. Na sua passagem pelas lombadas, detiveram-se as mãos numa palavra: Freud; e dali não saíram. Não sendo eu uma incondicional de Freud, outra explicação haveria. O filme é de John Huston, e narra o percurso do psiquiatra. Assisti, fascinada, à narrativa tão bem realizada, quanto interpretada. O argumento, perfeito. A dado momento, um sonho de Freud e um enigma: Os filhos devem fechar os olhos aos pecados dos pais. É uma cena belíssima, a busca interior de Freud pelo caminho das palavras até ao encontro com o mito.
Depois do filme, fiquei a pensar nestas histórias de filhos e pais, na infinita meada que não sabemos onde nem como começou, nem até onde levará o mundo. E tantas histórias em que filhos vilipendiam, acusam, defendem, idolatram, matam, reabilitam, ignoram, incriminam, socorrem, protegem, amam ou odeiam os pais. Não está no objectivo deste texto condenar ou apontar o certo e o errado. Quem me lê, sabe o quanto exalto as qualidades daqueles de quem nasci. Qualidades reais, que não invento. Que me comovem. Mas sabemos como a adolescência é o tempo da acusação. A juventude também. Estas duas idades têm, por vezes, o vício de continuar a esperar dos pais a divindade, a realeza e a perfeição que a infância vê neles. Com a agravante de que nessa primeira idade o olhar era mesmo assim, era natural, mas depois deixa de o ser. Resta apenas a teimosia e a birra em querer que desse modo permaneça. Daí a decepção, a que se segue a acusação. Muitos assim permanecem para sempre, num longo canto de desencanto e culpa. Mas às vezes, como no caso de Freud, um sonho põe em palavras limpas o que há a fazer. E o que há a fazer é simples, tão simples, que até uma criança o consegue fazer: fechar os olhos aos pecados dos pais. Não por uma abstracta bondade, mas por racional compaixão, justiça e liberdade. Muitos acreditam, mesmo, nos pais sem mácula. São os mais exigentes, porque um dia não vão tolerar que não seja como quiseram acreditar. E nesse dia será terrível a sua fúria. Afastem-se!
Não seria necessário. Basta que cada um se recorde de si, em vez de olhar para longe… Uma vez isto realizado dentro de cada um, passa a ser possível darmos connosco a conversar com aqueles que já partiram, e mesmo não os vendo, sentirmos, por vezes, o seu gentil apontar para caminhos que de outro modo nunca descortinaríamos. Por vezes, é importante fecharmos os olhos antes de os voltarmos a abrir. Para podermos ver o que se oculta ao comum dos olhares.
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