2021-10-13
Freud e Rilke, por Zweig


Risoleta C Pinto Pedro




Stefan Zweig é, sem dúvida, um peso pesado no universo dos grandes biógrafos. Talvez a passagem de uma carta de R. Rolland datada de 15 de maio de 1915 que lhe é dirigida, contenha, em parte, o “segredo” do talento:

«Você tem o dom de compreender através do amor. É um desses generosos espíritos europeus de que a nossa época precisa e cuja chegada eu esperava há vinte anos.»

Este dom da compreensão, se lhe permitiu ser o escritor e biógrafo excepcional que foi, não lhe facilitou a relação com a sua própria vida, a que acabou por pôr fim, no Brasil.

O discurso que escreveu a propósito de Freud, seu amigo, acaba por não ser do melhor que escreveu, porque a admiração toldou-lhe o estilo e aproximou-o do panegírico, ainda que sincero e sem dúvida merecido. O mesmo já não acontece com o que escreveu , por exemplo, sobre Rilke, com quem teve também uma relação muito próxima da amizade, porque neste texto o amigo cedeu o lugar ao biógrafo, que apresenta um retrato tocante e inspirador do poeta. De qualquer modo, do texto sobre Freud há uma passagem exemplar que não pode deixar indiferente quem ouviu ou quem lê: «Todos os que estamos aqui reunidos e ainda nos encontramos vivos, que respiramos, falamos, escutamos, todos nós aqui estamos espiritualmente mil vezes menos vivos que este morto imenso na estreiteza do seu caixão».

Sobre Rilke, que descreve como alguém cujos «modos doces tinham o poder de tornar reservados os mais activos, silenciosos os mais turbulentos, modestos os mais cheios de si mesmos. Onde ele se encontrava a atmosfera era como que purificada […] levava a todo o lado aonde ia uma certa pureza». Os apartamentos miseráveis e os quartos alugados onde viveu, sofriam, às vezes com o sóbrio toque de um único pormenor, uma verdadeira metamorfose, e quando alguém lhe emprestava um livro, devolvia-o «embrulhado quase ternamente em papel de seda, cingido por uma delicada fita colorida e acompanhado de uma pequena flor ou de uma palavra dedicada» a quem lho emprestara.

Esta é uma forma de fazer biografia: aliar à informação recolhida sobre o biografado, uma paixão pelo contar e a expressividade poética, resultando, sem essa intenção expressa, em textos profundamente educativos. Assim leio as biografias feitas por Agostinho da Silva, assim li a sua biografia pelo até agora seu único biógrafo: António Cândido Franco. Outros excelentes biógrafos e biografias estão disponíveis à nossa leitura, mas nenhum outro me tocou tanto. Foi um prazer encontrar, entre os livros do meu avô, algumas das biografias de Zweig. Confirma o pensador e leitor que foi, confirma algumas das minhas leituras enquanto linhagem. E um diálogo que se mantém para além dos mundos.

(Inspiração: Hommes et destins, de Stefan Zweig, Le Livre de Poche)

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