2011-12-28



Risoleta C Pinto Pedro


ESCUSAMOS DE FICAR DESCANSADOS

Pois escusamos. Percebi isso hoje ao passar junto de uma loja de produtos chineses. Esclareço que não tenho nada contra os chineses e até tenho conhecido pessoas encantadoras, nomeadamente na minha área profissional.

Mas foi com a visão da entrada de uma destas lojas que se deu o clique.

Já me tinha acontecido durante o mundial de futebol ficar mais ou menos em choque com as bandeiras nacionais (quero dizer, as portugueses, os tempos já pedem que se esclareça a que nos referimos quando falamos em nacional) com uns castelos em forma de pagodes. Se os tivesse visto, que teria escrito Pessoa no seu poema primeiro da Mensagem, "O dos Castelos"?

      PRIMEIRO / O DOS CASTELOS

      A Europa jaz, posta nos cotovelos:
      De Oriente a Ocidente jaz, fitando,
      E toldam-lhe românticos cabelos
      Olhos gregos, lembrando.
      O cotovelo esquerdo é recuado;
      O direito é em ângulo disposto.
      Aquele diz Itália onde é pousado;
      Este diz Inglaterra onde, afastado,
      A mão sustenta, em que se apoia o rosto.
      Fita, com olhar sphyngico e fatal,
      O Ocidente, futuro do passado.
      O rosto com que fita é Portugal.


Eu até não sou nacionalista, isto é, gosto do meu país, mas não ando por aí de bandeira em punho, no entanto, repito, não posso deixar de me interrogar que poema teria ele feito perante uma bandeira com castelos em forma de pagode?

Mas voltemos à tal entrada da loja. Que vejo eu à porta, no lugar nobre? Um pano vermelho, que poderia ser vermelho chinês ou o vermelho da bandeira nacional (pois, refiro-me, mais uma vez, ou ainda, à nossa) ou o vermelho Natal, com um menino Jesus desses que agora aí penduram nas janelas por esta época a marcar as casas cristãs como já tinham feito os judeus no Egito com sangue de cordeiro.

Neste caso, o vermelho não é de sangue de cordeiro, o símbolo não é judeu, mas cristão, embora Jesus não fosse cristão, mas judeu, cristãos só vieram depois dele, por causa dele, e a porta da casa também não era de judeus, mas de chineses. Mas não se admirem se na Páscoa se começarem a vender nestas lojas umas pinturas para pôr nas portas, a imitar sangue de cordeiro. É só dar a ideia...

Mas voltemos ao Jesus à porta da loja chinesa. Grande salada de símbolos, crenças, tradições e... economia.

O que se compreende.

Também não andamos a perguntar aos donos das lojas de bric-à-brac religioso em Fátima se são católicos. Nem têm de ser.

Mas não deixa de me fazer pensar, este símbolo do cristianismo em lugar nobre numa loja chinesa. Lá dentro, semiocultos, os budas velam. E isso é o menos. Há quem diga que Cristo e Buda são reencarnações do mesmo ser. Para quem lhe fizer sentido este tipo de crença.

O mais estranho é que me pareceu ver a fugir, a esconder-se por entre as louças, um buda vestido de Mao... mas o que é inquietante é que, lembrando bem, não era o tradicional fato maoista, bem visto, bem visto, acho que era mesmo um fato de executivo, a farda do capitalismo internacional mais violento e cruel, o que não se importa de se disfarçar do que for preciso, desde que consiga os seus fins. Até, se necessário for, de cordeiro.

Apetece dizer, gritar cantando, como na canção heroica de Lopes Graça: "Acordai, homens que dormis!"

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