Risoleta C Pinto Pedro
A JUSTIÇA
Falava-se no outro dia sobre a justiça, num círculo de reflexão. É um tema recorrente. No país e em certos círculos.
Muito se clama por justiça, mas cada um tem o seu código. Para alguns, justiça é o direito que todos têm de não terem menos do que eles. Para outros, significa ninguém ter direito a ter mais do que eles. Do género: Se eu trabalhei e suei para ter o pouco que tenho, quem és tu para ousares tê-lo sem esforço? E ainda por cima… com prazer?
Associa-se esforço a qualidade. O que até pode acontecer. Mas por que não considerar a possibilidade de haver outras formas?
Trabalho pode ser prazer. Trabalho pode não ser esforço. O mesmo para disciplina. Pode ser prazer e não ser esforço. Esforço pode não ser um compromisso do próprio para consigo mesmo, mas uma forma de auto-flagelação.
Tudo isto é complexo e ao mesmo tempo simples. Mas não simplório.
O acto do outro pode não me ter como alvo, nem ser uma falta de respeito, mas apenas inépcia, falta de sensibilidade ou medo.
A justiça igual para todos pode ser uma tremenda injustiça. Sabem-no alguns pais, perante filhos tão diferentes.
Mas há quem acredite caninamente nisso. Em nome de uma pretensa cegueira da Justiça. Mas atenção, que ter os olhos vendados não é ser cego.
Ter os olhos vendados é um estado de profunda clarividência. E inteligência. Porque muitas vezes são os olhos que nos cegam. Não exactamente os olhos, mas a o uso que fazemos (ou não fazemos) deles, o olhar de superfície.
Por isso a Justiça tem os olhos vendados. Mas não é cega. Quando a justiça é cega, também é estúpida. Não é Justiça.
A justiça cobre os olhos para ver em profundidade aquilo que apenas com um olhar acutilante, mais possível quando cerramos as pálpebras, consegue ver. O olhar que tudo trespassa, o olhar que não se deixa iludir nem enganar por falsos sorrisos, falsas provas, falsos esgares de vítimas, falsas provas de culpa. A Justiça sabe que por vezes é quando o olhar se vela que a verdade se revela. Como nos sonhos.
Porque não é cega. Mas clarividente.
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