Risoleta Pinto Pedro
AS ENERGIAS RENOVÁVEIS
Vínhamos falando sobre as energias renováveis e Helena dizia que enquanto não aprendermos isso dentro de nós não resolvemos a coisa por fora.
- Não é ao contrário?
Dizia-lhe eu.
- É esse o equívoco...
- Como é que aprendes uma coisa dessas dentro de ti? Terias de passar pelo nuclear...
- Como?!
- O nuclear. Andamos às voltas com as energias renováveis porque já esgotámos o carvão, o petróleo está a esgotar-se e...
- E?
- E já começámos a perceber que ou renovamos ou... ou...
- ... ou nos esvaímos, n?est-ce-pas?
- Exacto.
- Finalmente que estamos de acordo em relação a uma coisa. Só falta perceberes que o mesmo processo está dentro de ti, e enquanto não perceberes isso por dentro não percebes o de fora.
- Voltámos à vaca fria.
- Quente, quente. Olha, Eulália passou por uma experiência assim recentemente. Uma situação difícil de trabalho, muita tensão, muito stress, muitas horas seguidas, a energia estava a acabar-se, a paciência também e ela percebeu que estava em percurso acelerado para a doença.
- Cruzes!
- Sim, doença não é só uma úlcera, mas também a dor de cabeça, a falta de sono, a falta de paciência, a falta de atenção ao que te rodeia, a ti, aos outros, esqueceres-te que está sol lá fora, não reparares que aquela pessoa que esteve aqui a falar contigo estava triste, achares que não mereces sentares-te a meio do dia e tomares um bom almoço, que mereces um banho de imersão no final do dia com perfumes e sais...
- Ok, ok, e então?
- E então o quê?
- Eulália, ias falar dela.
- Ah sim, Eulália. Foi inteligente. Percebeu.
- Uma coisa é perceber, outra conseguir fazer.
- Se não consegues resolver, não percebeste nada.
- Isso levava-nos a outra discussão, mas está bem. Continua. Eulália...
- Eulália não deixou de fazer o que tinha de fazer. Mas tinha duas opções. Ou entrava numa alienação e estragava os olhos, a coluna e os nervos, ou...
- Ou?
- Ou não!
- Parece-me óbvio, a questão é... como é que numa situação dessas se diz não sem deixar de fazer o que é preciso?
- Com muito respeito por ela mesma.
- Isso é muito vago.
- Quero dizer: Um bom e tranquilo pequeno-almoço sentada, distribuição de sorrisos ao chegar, interrupção para saborear um chá e uns raios de sol a meio da manhã, almoço tranquilo, interrupção à tarde, piscina ao fim do dia ou passeio a pé, ou exposição, jantar leve e saboroso, dois dedos de conversa...
- Uma espécie de férias...
- No meio de trabalho árduo. Não conheço o dia-a-dia de Eulália minuto a minuto, mas asseguro-te que é qualquer coisa assim. Com uma boa noite de sono.
- Arriscava-se a não conseguir acabar.
- Claro.
- Ah! Dás-me razão!
- Em quê?
- O processo não resulta...
- Quem disse? Claro que ela se arriscava, mas se se entregasse estúpida e alienadamente ao trabalho sem respeito pelo corpo e pela alma, também não tinha garantias de conseguir, digo-te mais, tinha muito menos hipóteses de conseguir, porque cada vez que fazia uma pausa recomeçava mais repousada e tudo rendia muito mais, segundo me disse. Para além disso, o Universo...
- Sim...
- Deixa, não vale a pena?
- Vá, prometo que não chateio!
- Ia dizer que não há forma de alguma coisa correr mal quando respeitas as grandes leis...
- Sei lá disso!
- Fala com o teu corpo.
Eu já estava farta da conversa de Helena. Quando lhe dá para ser moralista... mas pensando em nós em termos das energias renováveis não podia deixar de lhe dar razão. Por isso afastei-me alegando uma aula de dança. Ainda não consegui passar por cima desta estúpida necessidade da aprovação dela...
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