2008-12-17
QUARTA-CRESCENTE


Risoleta Pinto Pedro


Marketing de Natal, alienação e inocência

Helena ouviu falar de uma super árvore de Natal erguida algures em Lisboa por uma empresa X, com um número astronómico de lâmpadas Y e tendo uma anormalidade de luzes tipo XPTO. Ela sabe, não é ingénua, que se trata de mais um fenómeno de marketing de uma qualquer empresa. A adulta sabe, e diz à criança que não passa disso, mas não consegue impedi-la de saltar de excitação perante a ideia de uma imensa árvore de Natal a iluminar a noite e a vida. Helena grande raciocina, critica, analisa, avalia, desgosta, afirma. Helena pequena pula, salta, bate palmas, ri, pergunta: "Anda ver, onde é?", causa mil perplexidades à Helena adulta, esclarecida, lúcida, politicamente correcta, porque não há como explicar à menina que tudo aquilo é uma imensa alienação.

- E depois?!

- Depois, é o que te digo!

- Mas a árvore está ou não está lá?

- Es... está...

- Então?! Vamos ver!

No coração de Helena (as duas) um baque.

Como teve coragem para separar de si mesma esta sua criança ainda viva, ainda feliz, ainda crente, ainda entusiasmada, iluminada pelos deuses?! E quer matá-la?! Que louca, Helena a grande.

Ei-las que vão. Uma saltita, a outra não. Mas vão.

Pega suavemente na menina pequenina ao colo, essa que ali vai a saltar a seu lado e ergue-a para ver melhor a árvore, as luzes. Atrás delas uma outra Helena, mais velha, mas com um sorriso gaiato, infantil, olhando-as.

Pergunta-lhe Helena adulta:

- Ainda gostas destas tretas do Natal?

E Helena, a futura, com um sorriso malicioso:

- Se ainda gosto?! Mas sempre gostei!

Regressam as três a casa, lentamente, cheias de luzes.



risoletapedro@netcabo.pt
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