A constelação natal Como antes, Helena vai buscar à arrecadação o velho saco onde guarda as figurinhas do presépio. Como antes, dispõe os actores segundo os seus papéis. A mãe e o pai ladeiam a criança. O leito onde esta repousa continua a ser a velha manjedoura, em vez de um moderno edredão de penas, o velho revestimento de palhas. Como antes. Atrás da sagrada família, um anjo de cores desbotadas. À frente, a vaca, o burro, duas ovelhas e um cão. Lá longe três magos montados em camelos. Pela estrada do tempo foram ficando perdidos a pastora, o galarito, o moinho, a ponte sobre um lago, e outros de que nem resta memória. Ao contrário do outro, o antigo, que era quase uma aldeia montada no chão sobre um tapete de musgo viçoso, polvilhado aqui e ali de farinha e algodão a imitar neve, este presépio instalou o seu palco sobre um piano cujo lacado da madeira um tecido que uma menina em tempos bordou, protege. Ponto pé de flor. Um nome poético para uma recordação bordada a bem-me-queres e amores-perfeitos. Helena dispõe os actores segundo os seus papéis, mas repara agora que ao contrário do habitual, não o fez impacientemente no primeiro dia do ano, que não desembrulhou febrilmente os papéis de jornal que protegem as pequenas figuras, com a saudade de um ano, mas que as despiu com todo o vagar e as colocou sobre o palco, onde constelou a família, com a consciência de que esta tríade é sagrada, e que é uma constelação, e que não é aleatória a forma como dispõe os actores. Começa pelo menino, em cuja vontade afinal tudo começa. A manjedoura que há décadas se equilibra com uma dificuldade periclitante, é agora amparada pelo corpo da mãe e do pai, que a sustêm e equilibram. O menino não corre perigo de cair, está protegido por um pai, por uma mãe conscientes do Ser. Depois vem o anjo, que sustém o pai, a mãe. Não com o corpo, mas antes com sua vontade de anjo. Não há o perigo de vacilarem como pai, como mãe. Com tal anjo, com tal pai, com tal mãe, o menino está seguro e a salvo. A partir daqui já é mais ou menos aleatório de que lado está o burro, de que lado está a vaca, mas não é indiferente o lugar da Mãe, o lugar do Pai. Deve a Lua estar a Norte, deve o Sol estar a Sul. Assim se coloca do lado esquerdo do menino estrela o pai, do lado direito a mãe. Conformes à ordem do universo, que este teatro é o do rigor e da atenção. Agora está tudo certo, Helena dispõe casualmente as lâmpadas sobre a pequena árvore de Natal artificial, esta também sobre o piano, tranquilizada e tranquila. O teatro está completo e a magia feita. Resta esperar a chegada dos Reis. risoletapedro@netcabo.pt http://risocordetejo.blogspot.com/ |
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