Concerto sem conserto?
Era uma espécie de oficina-concerto comentado. Um músico falava de um compositor, da sua vida, época, obra. Ia mostrando partes, ia juntando partes, conversando, projectando pequenos filmes, cenas de óperas, testemunhos. O público, muito atento e silencioso. Quando o músico chamou o quarteto para, finalmente, interpretar ao vivo uma peça do compositor, começou o que eu já previa, o incontornável concerto para tosse a várias vozes. Sempre me interroguei que estranha alergia terão os portugueses à música, que mal começa um concerto, se ouvem tosses abafadas e nos intervalos dos andamentos ou das peças, as salas de concerto tornam-se estranhamente parecidas com sanatórios de tuberculosos. Toda a gente tosse, uns desesperada outros metodicamente, mas com muita eficiência, usando o tempo disponível antes de os músicos atacarem outra vez, e o coro termina rigorosamente antes do primeiro acorde; às vezes algum mais distraído com mais dificuldade em sentir o tempo, ou sem educação musical, ou com um problema de saúde mais grave, termina mesmo em cima da primeira nota, o que é alvo de silenciosas censuras dos mais saudáveis. Sai-se cá para fora e terminam de vez os acessos de tosse. É um mistério nacional que, tal como o sebastianismo, nunca consegui entender. Mas existe.
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