2019-05-08



Risoleta C Pinto Pedro


Sintaxe de plástico



«A quantidade de plástico junto às praias do Bali mancham o prestígio das praias da Indonésia».

Ouvi algures este comentário/notícia e trouxe-o a este palco de reflexão onde exponho, partilho e problematizo ideias que vão da língua à política passando pela física e pela metafísica (que nunca estiveram tão próximas), sem que seja especialista em nenhuma das áreas, apesar de me sentir mais à vontade nos assuntos relacionados com a língua.

A afirmação acima citada cruza, pelo menos, dois problemas, sendo, contudo, se virmos bem as coisas, apenas um: o da poluição. A poluição ecológica e a poluição linguística. E, de alguma forma, o turismo, sobretudo no tocante às praias.

A preocupação com o lixo nas praias não me comove muito, se o motivo for, exclusivamente, o turismo. Já o mesmo não posso afirmar se a causa for a brutalidade, o desprezo e a inconsciência com que nos relacionamos com o planeta que nos foi útero, berço, e é cama, mesa, casa e jardim. Mantemos limpo o nosso cantinho, e atiramos o lixo para o jardim da casa ao lado. Depois, ao vermos o que fizemos, preocupamo-nos com o prestígio. Não o nosso prestígio face ao Universo, a vergonha que representa comportarmo-nos de modo que nem os porcos fazem, e ficarmos preocupados sim, com o prestígio do lugar que sujámos. Digamos que é uma forma um bocado invertida de colocar o problema. Face a isto, o tema que me trouxe a esta crónica, a falta de concordância entre o sujeito e o predicado (sendo sujeito «a quantidade de plástico», o predicado terá de estar no singular: mancha e não «mancham», como é dito), problema tão frequente e poluidor da nossa oralidade, acaba por ficar aqui em segundo plano. Afinal, para podermos usar bem a sintaxe precisamos de estar, necessariamente, vivos. O que não é certo em relação a uma altíssima percentagem dos humanos viventes.

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