2017-07-19



Risoleta C Pinto Pedro


Inteligência, tristeza e compaixão

Fiquei no outro dia a saber, algures na Internet, talvez no FB, que no que toca à inteligência, estamos conversados. Era um daqueles artigos com teorias bombásticas, e este anunciava um estudo recente (ai, os estudos, os estudos, ai, os estudos recentes, como se isso fizesse parte da garantia científica da coisa...) onde se concluía que pessoas inteligentes não têm muitos amigos e que pessoas com muitos amigos não são muito inteligentes. Ora eu, que não sou pessoa de poucos amigos, situo-me mais no segundo grupo... o que não me entristece nada. Um amigo vale mais do que um neurónio. Conheço imensas pessoas inteligentíssimas a quem a inteligência deu cabo da vida, diria mais, de quem a inteligência foi o seu pior inimigo, porque se vira contra elas, contam-se histórias mirabolantes a si mesmas, enrolam-se em mentiras sofisticadas, enredam-se em enredos do arco da velha, e às tantas já estão a tal ponto envolvidas na ficção, que a vida tem um trabalhão para libertá-las de si próprias, e só à tesourada, ao pontapé e ao murro é que consegue desfazer-lhes os nós.

Isto a propósito de eu não ser muito inteligente, por culpa dos meus amigos. E isto a propósito de umas longas conversas que costumo ter ao telefone com uma das minhas amigas, que também não deve ser muito inteligente, mas quando conversamos as duas durante um bocado chegamos sempre a descobertas extraordnárias, que se deve dever (gostaram da redundância em jeito de aliteração?, para uma palerma carregada de amigos não está nada mal...) às duas inteligências juntas conseguirem produzir alguma fagulha mental.

No outro dia era sobre a tristeza que às vezes o dia do aniversário traz acoplada, embora não se fale muito nisso, é preciso mostrar sorrisos, cantar os parabéns, etc, etc, a verdade é que o dia do aniversário actualiza, a maior parte das vezes, alguns aspectos do trauma de nascimento ainda não revisitados, e convém fazê-lo enquanto estamos por cá, visto tratar-se de um assunto local. Diz-se que o criminoso volta sempre ao local do crime, mas os inocentes também... voltam sempre ao local onde não houve crime para perceberem que não houve, que está tudo bem, como sempre esteve, e que podem continuar e festejar descansados.

Falava-se, então, de tristeza e de como pode, às vezes, ser sentida como esmagadora, tanto, que dá ideia que não é só nossa, como se transportássemos toda a tristeza do Universo. Umas vezes surge de forma misteriosa, outras directamente do contacto com o sofrimento do outro. Neste segundo caso, há um sentimento anterior, a empatia, que permite sentir como o outro. É uma fase ainda desorganizada da tristeza, digamos que corresponde ao período do caos. É imprescindível, e embora seja prévia ao estado seguinte, não consigo hierarquizar, pois sem essa tristeza como o outro, por meio da empatia, nunca poderíamos chegar à tristeza com o outro, um estado de tristeza mais organizado, mais interactivo, como um miradouro maior para o que se está a sentir, maior capacidade de distância sem que a compreensão deixe de estar presente. No primeiro caso estamos perante o sofrimento, aquele que esmaga, cega e urra, que confunde o eu e o outro, unidos no mesmo desespero; no segundo estamos perante a dor, aquela que compreende, age e passa no outro o bálsamo que refresca e alivia. É a compaixão. Coisa de pessoas pouco espertas. E fora de moda... Temos pena!

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