Risoleta C Pinto Pedro
Éramos felizes e não sabíamos
Vem isto a propósito do poema “No tempo em que festejavam o dia dos meus anos”, de Álvaro de Campos. É um poema extraordinário. Depois de Deus, talvez mais ninguém tenha compreendido tão bem a humanidade. Quase no final do poema, ele escreve:
«Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...»
E eu, que sou muito atrevida, ouso interrogar Pessoa/Campos. Ouso interrogar o génio: qual passado? O dos cinco? O dos dez? O dos quinze? O de ontem? O ontem também é passado.
Às vezes, eu sinto como ele:
«Eu era feliz e ninguém estava morto.»
Outras vezes penso como eu. E já explico como é que eu penso. Que afinal, também é como ele, quando diz:
«Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!»
Ou então, coração, pensa de outra maneira, experimenta mudar o pensamento. És o teu próprio pensador. Ninguém te obriga a pensar assim. Podes mudar… o pensar. É um facto que as pessoas (e os animais…) foram sendo arrancados da tua vida como dentes em boca de menino, é verdade que já não estão cá todos… em modo visível, pelo menos. A uns falta um filho, a outros um pai (ou dois), um neto, um irmão, uns avós… É verdade, a avó já não acende a sagrada lareira no chão, já não se ouvem os risos do menino, já não tens a mão do pai nem o ronronar daquele gatinho especial. É verdade. Mas ainda tens muitas pessoas à tua volta, honra a sua presença não a desvalorizando, não a desmerecendo. E há as flores e há o sol. E existes… tu. Amanhã, quando tiver partido mais um animal, mais uma pessoa, terás saudades de hoje… Então, se dantes eras feliz e não sabias, deixa-me que te diga:
Hoje és feliz e não sabes!
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