Risoleta C Pinto Pedro
Sampaio Bruno e o futuro
(No centenário da morte de Sampaio Bruno)
"Alguns reclamam a pena de morte para os crimes mais repugnantes, convencidos que isso resolvia um problema que afecta o mundo inteiro (se a morte fosse assim tão temível, nem sequer haveria guerras!...) e esquecendo-se que mesmo a atingir-se o efeito desejado, saldava-se um crime com outro crime."
António da Conceição Pedro, 12-03-81
Assinalou-se a 6 de Novembro de 2015 o centenário da morte de Sampaio Bruno, esse que foi buscar ao obscuro nome que o registo oficial não lhe assinala, o aclaramento de quem sabe que é pelo escuro que nos aproximamos da luz. Refiro-me, para quem desconheça, ao facto de José Pereira de Sampaio ter acrescentado ao seu nome um usualmente designado como pseudónimo, mas neste caso, nobre título, que desse modo o usou, de Bruno, em homenagem a Giordano Bruno, essa outra luminária que habitou o planeta, condenado à tenebrosa fogueira pela Inquisição de Roma, em finais do século XVI, por ter afirmado a teoria heliocêntrica.
O texto que serve de epígrafe a esta crónica é da autoria de uma outra luz que me deu o ser e trata-se de uma passagem de um discurso mais amplo sobre temas vários.
Também Sampaio Bruno escreveu por diversas vezes sobre o tema da pena de morte, que não está tão desactualizado como poderemos ter a tentação de acreditar.
A pena de morte ou o mero desejo de exterminar o outro tem sido uma constante ao longo da história da humanidade. Num quadro legal ou fora dele, a nível colectivo ou individual.
Hoje ainda, os estados não perdem a oportunidade de vingar-se com ferro e fogo do fogo e ferro com que ainda se vão fazendo as relações entre povos, etnias e religiões. Estados e pessoas.
Ele próprio, Bruno, o nosso escritor, ensaísta e filósofo, figura gigante da Filosofia Portuguesa, foi seriamente vítima de agressão por Afonso Costa, apesar de ambos pertencerem ao Partido Republicano Português.
Mas onde pretendo chegar é ao lugar onde tudo se cura, onde tudo se alquimiza, onde tudo se transforma: a magia das palavras, o lugar da escrita, a taça do pensamento humano.
Assim, transcrevo o iluminado e iluminador Sampaio Bruno, o obscuro e luminoso filósofo:
"Esta doutrina, (Falsa, imoral, desastrosa) do tiranicídio - enganam-se os loucos e os perversos que a professam hoje - não pode ser a doutrina do presente, muito menos a do futuro, precisamente porque foi a doutrina do passado.[...] Mas o progresso moral da humanidade não poderia deixar de dissipar das consciências este fúnebre erro; [...] um crime é sempre um crime, ainda quando, mesmo, tivesse por fito libertar uma nação da tirania; [a santidade do fim não justifica a infâmia dos meios; e que, longe de nos aproximar do alvo que temos em mira, os processos imorais nos afastam dele. E cita Laurent: «O tiranicídio não libertou a Grécia e não libertou Roma; de tiranicídio em tiranicídio, a antiguidade chegou á dissolução e à morte».
E porque foi assim?
Porque, se as revoluções são, em dada hipótese, um direito e por vezes um dever, o assassinato é sempre um crime."
E continua:
"o terror empurra à vingança; ao crime individual opõe-se o crime social; a humanidade sofre."
Pensamento lúcido e actual que é possível encontrar em, pelo menos, dois dos seus livros: Portuenses Ilustres e O Encoberto.
Remata ainda, magistralmente, a propósito da cadeira eléctrica: "esta coisa ímpia: a aplicação das descobertas puras dos sábios aos apaixonados rancores das gentes. O engenheiro electricista transforma-se, desta arte, em carrasco, e a América poderia, assim, convidar para a certeza fulminante dos suplícios... Edison.
Que horror!
Sombrio tempo o nosso..."
Decreta que no futuro "não haverá pena de morte, porque o crime de um delituoso não autoriza nunca a reprodução do mesmo acto, como castigo [...]; não haverá guerra, porque o interesse de um país não compensa nunca a imposição da morte a seus nacionais e aos estranhos, contendores."
Olhando à volta, não parece ter mudado muito o mundo desde o final do século XIX. Sampaio Bruno mostra o futuro que queria para nós. E nós? Passados cem anos, o que queremos? Sabê-lo-emos? É que quando não sabemos o que queremos, normalmente acabamos tendo o que não queríamos.
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