Risoleta C Pinto Pedro
OS INSUBSTITUÍVEIS
Há pessoas que são insubstituíveis. Diz-se. De outros poderíamos passar bem sem eles.
No entanto, os primeiros acabam por, mais cedo ou mais tarde, virem a ser substituídos, e aos outros temos de apanhar com eles a morderem-nos ou pelo menos a ladrarem-nos às canelas muito mais tempo do que teríamos desejado. São os paradoxos da vida. Que não são mais do que o conflito entre a vontade e a necessidade.
Quero dizer com isto que como diz a canção, “sei que posso querer tudo, mas nem tudo me convém”; vai um abismo entre o que me é agradável e o que me é necessário, útil ou conveniente.
Entre os insubstituíveis e os indesejáveis não há vazio, porque todos partilhamos do mesmo universo e a pele é apenas uma ilusória parede entre o interior e o exterior, entre nós e o mundo. Tal como os insubstituíveis e os indesejáveis estão mais próximos do que parecem, o mesmo se passa entre o fora e o dentro, entre nós e o mundo.
Torna-se cada vez mais importante que revejamos os conceitos que aprendemos desde meninos. Um insubstituível apenas o é na “minha” ótica, e mesmo eu acabo por vê-lo ser um dia substituído. Porque na verdade, insubstituíveis somos todos, porque todos somos únicos e como isso preciosos. Precisos. Mas não indispensáveis. Somos preciosos e precisos enquanto estivermos aqui. E não desaparece do mundo a marca de cá termos estado. Não apenas dos célebres ou dos que de alguma forma deixaram a sua assinatura. Todos vêm deixar uma marca. E a marca dos indesejáveis não é menor nem menos importante.
Entramos aqui, reconheço, em tema polémico e movediço, e como o que me anima não é alimentar polémica, mas desarrumar certezas, hoje vim aqui dizer que aprendemos por vezes mais com os indesejáveis do que com os insubstituíveis, e que nessa perspetiva, os indesejáveis são insubstituíveis e os insubstituíveis acabam todos por ser substituídos. Sem que deixem de o ser.
A vida sabe e a vida faz. Passa por cima das nossas vontades ainda que tenha de derrubá-las como a um muro de Berlim ou a muralha da China. Quando nos vê no chão traz-nos numa bandeja o que precisamos: óleo de fígado de bacalhau. Quando nos habituamos e deixamos de fazer cara feia, começa a juntar-lhe xarope de banana. Não antes. Só quando já nos é mais ou menos indiferente.
Assim é a vida. Dura, engraçada, generosa. Convém compreendê-la. Afinal é amiga. Insubstituível, mesmo quando parece indesejável.
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