2012-10-17



Risoleta C Pinto Pedro


"JÁ COMEMOS QUASE OS TREMOÇOS TODOS"

Vinha no mesmo Expresso que eu. Eu um pouco mais à frente, ela mais atrás com outra menina; num banco ao lado, a avó.

Percebi, pela conversa, que vinham de muito longe e as meninas perguntavam amiúde se ainda faltava muito.

As respostas eram absolutamente desconcertantes, pelo menos para mim. A duas horas do destino era-lhes respondido que faltava ora uma hora, ora uma hora e meia. Com duas paragens pelo meio, era-lhes dito que saíam já na próxima paragem. Tanto, que inicialmente até pensei que iriam sair em Tomar ou Torres Novas. Um prodígio de incoerência. Assim são os adultos.

Percebi, também, que os pais das meninas vinham no carro, um pouco mais à frente ou um pouco mais atrás da camioneta, mas também se dirigiam a Lisboa.

Às tantas, ouvi a menina a falar ao telemóvel com a mãe, e dizia:

"Já andámos bué, mamã." E repetia o que parecia ser uma pergunta da mãe, do outro lado: "Onde é que nós estamos?"

Era a mãe a tentar saber. Neste momento, a menina perguntava à avó, que não lhe sabia dizer e seguidamente respondia sem o mínimo de fiabilidade. A inteligente menina não se atrapalhou e não deixou de prestar à mãe a informação pedida: " Olha, já comemos quase os tremoços todos..."

Eu fiquei encantada com o rigor da localização. Sem ironia. Para uma mãe, não poderia haver uma descrição mais exata acerca da localização da filha. Uma mãe sabe, perfeitamente, quantos tremoços a sua filha come por quilómetro. Uma mãe (que também pode ser um pai...) sabe com mais rigor quantos tremoços a filha come por quilómetro do que o pai sabe quantos litros o carro consome aos 100. E a filha sabe que ela sabe.



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