2011-11-16



Risoleta C Pinto Pedro


Passadeiras e produtividade

Creio que descobri o segredo. Embora até me pareça mentira. Pode ser um problema de autoestima. Como é que uma evidência tão evidente aos olhos de todos apenas a mim se revela? Visto de um lado, é uma autoestima abaixo de cão; do outro, uma desmedida megalomania. Por qual me decido? Vacilo.

Ou antes, explico:

Compreendi por que razão os nossos níveis de produtividade estão tão baixos, como dizem os governantes. E eu acredito. Não tenho nenhum motivo para não acreditar: nunca nenhum foi acusado por mentir. Apenas suspeitas. Suspeitas não são crime, todos sabem.

Mas voltemos ao assunto. Até me custa, porque é tão, tão simples, tão razoável, que continua a embaraçar-me ter de explicar o óbvio.

Num momento em que o país se encontra no estado que se sabe, em que alguns portugueses vão receber menos e outros vão trabalhar mais (a próxima etapa é um terceiro grupo que nem sei quem seja, a não ser que comecem também a recrutar e quem sabe, tributar, os que já estão nos cemitérios começarem a receber menos e a trabalhar mais, porque ainda ninguém pensou que não existe uma relação direta entre trabalhar mais e trabalhar melhor, sendo que trabalhar melhor seria produzir mais; ora a "visão" do governo, pelo contrário, é que é preciso ficar "lá" muitas horas, onde quer que esteja situado este "lá"), neste momento histórico, dizia, ainda ninguém reparou no que se passa nas passadeiras deste país. Não me refiro a automobilistas a fazerem pontaria a peões em manobra de atravessar, não é isso, isso é uma coisa relativamente rápida, não rouba horas de trabalho, pelo contrário, o automobilista que não para na passadeira é um patriota, porque chega mais depressa ao emprego. Referia-me a esses contrarrevolucionários que se põem à beira das passadeiras só para nos fazerem parar e ao fim de muitos gestos de passe o senhor, faça favor, por quem é, passe, finalmente se resolvem a dizer que não querem passar, estão só ali à espera da boleia ou do táxi. Nisto já se passaram uns preciosos minutos e por causa disso nós, que já levávamos os segundos contados, acabamos por chegar atrasados ao emprego. É uma tragédia nacional. E no entanto, resolvia-se muito bem. Dizem que temos boas leis, mas ainda nos falta esta. Façam as contas aos minutos que todos os dias, por esse Portugal, pessoas à beira das passadeiras fazem perder aos automobilistas educados e cumpridores e até mesmo delicados e dedicados a comportamentos cívicos, e isto pode ascender a muitas horas de trabalho, mais do que a tal hora diária dos funcionários não públicos. Façam uma lei que proíba as pessoas de esperarem pelas boleias à beira das passadeiras. Mas depois façam-na aplicar. Porque o problema da nossa justiça é ter boas leis e não as aplicar.

Uma multa a estes egoístas não só poderia evitar o não pagamento dos subsídios aos funcionários públicos, como ainda evitar a tal hora a mais aos outros. E seríamos felizes. Para sempre.

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