2018-10-17



Risoleta C Pinto Pedro


À sem agá?



Não gosto nada de me queixar, mas desta vez tem de ser. Vou queixar-me de tudo, a começar pelas operadoras de comunicações. Foi um sarilho para sair da MEO, parecia que tinha entrado numa seita que não me deixava sair. Indescritível, até fico cansada só de me recordar do pesadelo. Agora estou na NOS, que para renovar o contrato, me acena com uma nova box e um novo router que não me faziam falta e não pedi, e mais gigas, que dão sempre jeito, enfim, daquelas coisas inúteis sem as quais acreditamos que já não conseguimos passar, e já que a NOS estava numa de boa vontade, eu, como menina mimada, disse que queria mais um brinquedo: um dispositivo de internet móvel. Admito que esse sim, me fazia falta e acordámos em que pagaria uma módica mensalidade, inferior ao preço normal do mercado. Eu já estava satisfeita com o meu pacote de rebuçados a deitar por fora, mas ainda me ofereceram o dispositivo, por ser uma boa cliente. Até aqui não poderia ter corrido melhor. Depois veio cá o técnico instalar a box e o router e foi tão simpático e competente, e ainda por cima não se deixou impressionar e muito menos amedrontar com três cães a cheirá-lo e a meterem os focinhos na caixa de ferramentas, para além de ter mostrado a maior empatia por causa de um ogre aqui das redondezas que não gosta de cães nem de pessoas, que até lhe dei uma gorjeta. Os problemas começaram com a entrega do tal dispositivo móvel que chegaria via estafeta. O qual não apareceu entre as 9.00 e as 18.00 anunciadas, não telefonou, ao contrário do que me fora prometido pela central, e no dia seguinte nem sequer consegui falar com a empresa para ouvir as desculpas esfarrapadas do dia anterior, o que já seria alguma coisa. A empresa de entregas é chamada Via Directa, não se sabe é para onde... não certamente para onde devem ir, mas para onde lhes apetece.

Em desespero ligo para a NOS, que me sugere que agendemos um outro dia. Não sei se andam a investigar sobre a vida das pessoas, para saberem que por acaso me é possível, tirando o transtorno para os cães, que gostam de passear de manhã, ficar em casa três dias seguidos sem entrar em depressão. Quando perguntei se me dariam a garantia de que dessa próxima vez não falhariam, foi-me respondido que não, não podiam dar, a tal via não andava a ser, ultimamente, muito directa...

Isto deixou-me sem palavras, senti-me desamparada como criança que acaba de descobrir que os pais não são perfeitos ou como adolescente que se sente abandonada por Deus. Senti-me a falar perante uma parede que só devolve ecos e na verdade não responde e nunca responderá. Quem é a NOS? Quem é a Via Directa? Quem, dentro destas empresas, se responsabiliza por alguma coisa? Qual é o rosto? A quem posso pedir responsabilidades, insultar, suplicar, seduzir, etc, etc? Não existe! Só há uns desgraçados com sotaque do norte (por que será?, têm todos sotaque do norte...) e enquanto não atendem tenho de ouvir "A minha casinha" em 666 versões... um horror! ) num call center e cada um com quem falo responde à sua maneira...

Este, já tão desesperado como eu, acabou por me sugerir que fosse levantar o equipamento a uma loja. O que, ingenuamente, fiz. Quero dizer: fui à loja, mas não pude levantar o equipamento, porque para o fazer teria de pagar, e o meu é gratuito. Acabei por fazer uma reclamação sob o olhar compreensivo e apiedado, diria até compassivo do funcionário, e quando cheguei a casa, no conforto do lar e sob os raios reconfortantes do wireless, que lá vai funcionando, liguei para a NOS. Contei a história toda. Cheguei à conclusão que a NOS, a MEO, a Via Directa e instituições afins, poderiam funcionar como uma espécie de SOS Voz Amiga; as pessoas ligam para lá a desabafar, do lado de lá ouvem-nas, procuram consolá-las e assim, mas não podem fazer mais nada, que é como suponho que funciona o SOS, mas que neste caso já é muito. O único problema é que a NOS e a MEO não foram criadas com este propósito, é suposto resolverem questões práticas que se prendem com cumprir os compromissos. Mas não. São só SOS's de desabafos. E duvido que, ao contrário do SOS Voz Amiga, consigam evitar alguns suicídios de gente mais desesperada.

Desta vez, perguntaram-me se queria marcar uma outra entrega, ao que eu respondi que não, se não haveria alternativa... Pois não havia. Tínhamos de marcar outra entrega. Perguntei que garantia tinha de que haveria entrega e não ficaria em casa inutilmente, com sacrifício dos cães. Foi-me respondido que quando a NOS marca uma entrega é com a intenção de que a entrega seja feita. Lapidar. Estávamos num impasse. Eu sabia que podia ser verdade relativamente à intenção, quanto ao resto... tentei explicar, esbarrei num muro de silêncio ofendido. A ofendida era ela, note-se... Marcámos. Pediu-me que confirmasse a morada. E perguntou-me se era com ou sem agá. Não percebi. Perguntei-lhe onde é que queria pôr um agá... Explicou-me, com um ar profissional, imperturbável, levemente acusador, escandalizada com a minha pergunta. Senti-me estúpida, depois percebi: o nome da minha rua termina com a expressão à Graça. Estive quase para responder que sim, que escrevesse há Graça. Mas não há graça nenhuma nesta história interminável. E digo mais: já me é completamente indiferente que escreva à Graça com ou sem h, quero é o dispositivo e já, tornou-se uma urgência, e por favor, contratem uma empresa que não se chame Via Directa, até pode passar por Roma e fazer os desvios todos que lhe apetecer, desde que saia já, imediatamente, de modo a chegar cá no dia 23 da parte da tarde, para eu poder levar os cães à rua pela manhã, afinal as grandes vítimas, no meio disto tudo. E não se queixam.

II parte: Escrevo esta parte uma semana depois de ter feito de Penélope à espera do estafeta. Supostamente, tenho uma entrega marcada para daqui a uma semana. Faz amanhã uma semana que não apareceram. Recordam-se? A NOS cancelou a entrega de há uma semana atrás. Hoje, nesta semana limbo, entre a entrega que não houve e a que, quero acreditar, haverá, recebo SMS de ViaDirecta (escrevem assim, tudo junto, deve ser para não perderem tempo a fazer espaços) e dizia assim (não vão acreditar): "A encomenda com a ref. nº tal encontra-se em distribuição, aguarde contacto do nosso distribuidor. Qualquer alteração, ligue (nº telef) entre as 9.00 e as 19.00.". E eu pergunto. É a entrega de há oito dias ou a daqui a oito? Seja como for, é animador. Com esta antecedência acho provável que consigam chegar no dia 23. Afinal, ainda bem que se chamam assim. Imaginem o que seria se não tivessem um nome tão positivo, tão pro-activo. Isto digo eu, mas eu sou uma optimista...

http://aluzdascasas.blogspot.com/
http://diz-mecomonasceste.blogspot.com/
http://escritacuracriativa.blogspot.pt/
http://www.facebook.com/risoleta.pedro
http://risoletacpintopedro.wix.com/risoletacpintopedro



Ver crónicas anteriores



LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS