2017-12-27



Risoleta C Pinto Pedro


O MEU SONHO PARA UM NATAL

Não só as personagens boas são inspiradoras. Ebenezer Scrooge era frio, impiedoso e avaro. Tinha tudo para poder ser confundido com um psicopata, mas era, sobretudo, um misantropo. Se fosse psicopata ou sociopata, provavelmente não teria mudado. É uma doença da alma dificilmente curável, porque aquele que sofre dela não consegue ter consciência do seu mal. O misantropo pode saber que o é e escolher sê-lo ou não. Normalmente é o medo que o afasta do coração dos outros. Já o sociopata está afastado do seu próprio coração. É uma doença mortal, porque o indivíduo, julgando que está a tratar mal os outros, mata-se a si mesmo. Como alguém disse, anda sempre a tomar taças de veneno esperando que faça mal aos outros.

Mas a personagem de Um Conto de Natal de Dickens, de coração frio e que não sabia dar, nem ser gentil, acaba por mudar. É verdade que o tratamento é de choque. O isolamento a que se votava por desconfiança em relação à humanidade, termina com a visão proporcionada por uma espécie de sonhos que o transformam radicalmente, num Natal. Um misto de medo e compaixão ao assistir ao sofrimento dos outros e à sua própria dor maior, a continuar na senda trilhada, leva-o a escolher outro rumo, começando pela abertura do coração. Não sabemos se se trata de uma intervenção cirúrgica ou de uma ressurreição, a verdade é que mudou. Todos nós conhecemos ou temos no nosso mundo próximo ou mais remoto, um misantropo e, na pior das hipóteses, um psicopata. Eu, para facilitar, como não sou médica e não sei fazer este tipo de diagnóstico, chamo-lhe ogre, uma forma simpática e esperançosa de acolher a possibilidade de ele se salvar... de si mesmo. Recordando-me do Shrek, esse ogre tão "fofinho" da animação, deixo em aberto uma porta salvífica à transformação do "meu" ogre. Vive na minha rua e esforça-se por massacrar metodicamente algumas pessoas que escolhe a dedo. Os ogres batem nas suas mulheres e nos seus cães, não suportam ouvir ladrar outros animais, fazem desaparecer coisas das outras pessoas, embirram com a localização dos contentores de lixo, introduzem lixo nos contentores às portas dos vizinhos em horas menos recomendáveis, trazem lixo para as portas, colocam objectos estranhos nas caixas de correio, não pagam as suas dívidas como se se sentissem acima da humanidade, e excepto quando se passam e batem com as portas ou discutem ou gritam da janela, são silenciosos e tristes, mas mascaram a tristeza com um ar zangado com que afugentam as pessoas. Eu sinto alguma compaixão por pessoas tão infelizes, pelo que sou incapaz de lhes devolver a maldade, tento ser simpática nas raras oportunidades que surgem e até convidava o "meu" ogre para a ceia de Natal para ele não ficar sozinho. Mas não havendo oportunidade, fico à espera que um sonho, mais eficaz do que eu, à dimensão de Charles Dickens, o visite nas entranhas, lhe percorra as artérias e lhe invada o coração até à total transformação e libertação do ser humano que existe dentro de si e que, no fundo, só deseja libertar-se do medo em que vive e ser feliz. Aqui deixo ao Menino Jesus este desejo, para quando Ele considerar possível de satisfazer. Porque Ele é que sabe.

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