2015-07-01



Risoleta C Pinto Pedro


O mundo das águas e das águias



                “Desde a sombra do bosque desde a orla do mar
                Caminhei para Delphos
                Porque acreditei que o mundo era sagrado
                E tinha um centro
                Que duas águias definem no bronze de um voo imóvel e pesado
                Porém quando cheguei o palácio jazia disperso e destruído
                As águias tinham-se ocultado no lugar da sombra mais antiga
                A língua torceu-se na boca da Sibila
                A água que primeiro eu escutei já não se ouvia.”

                Sophia de Mello Breyner, Dual


É um poema belo e desencantado composto de beleza. A beleza ao serviço do desapontamento e do desencanto. Sophia é uma poeta do real, uma lírica de denúncia encontra-se na sua poesia. Este poema constrói-se sobre tempo: “desde”, “quando” e “já”.

O “desde” é aqui do domínio do sagrado e é justificado pela fé. O “quando” aparece “adversativizado” pelo “porém”, surge o obstáculo que sempre caracteriza a viagem do herói. O “já” é sem apelo. O herói sucumbe ao obstáculo.

A alegoria não está completa. O herói ergue-se sempre sobre a treva, o monstro ou o medo.

Cabe-nos a nós desocultar as águias, reconstruir o palácio, libertar a língua e a água.

Porque existe mais do que um mundo. Aquele em que precisamos de acreditar é sagrado e tem um centro definido pelo voo de duas águias.

Não é meia dúzia de símios agarrados a uma máquina de calcular que pode destruir um mundo assim. Porque vai contra a natureza. E a eternidade.


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