Não é uma crónica sobre política, mas não deixa de ser uma crónica política,
pois tudo o que trata da pólis a ela diz respeito.
Ficou-me daquele dia um nome: Drª Rita Matos. Uma jovem médica dos
Hospitais Civis que nessa manhã me telefonou, ia eu já a meio da ponte a
caminho de Lisboa. Pusera-me ao volante mal me ligaram informando que
fora chamado o 112 para a minha mãe. A Drª Rita, que eu não conhecia de
lado nenhum e vice-versa, que estava nessa manhã na urgência, precisava de
algumas informações sobre os 94 anos da minha mãe, mas eu estava quase a
chegar. Fora a voar por cima do rio!
Uma vez chegada ao Hospital e vencidas as necessárias burocracias da
entrada, a minha mãe já fizera todos os exames e estava para descer depois de
completado o último. Um funcionário ia buscá-la e convidou-me a subir com
ele, mas ficando a saber das minhas resistências em relação aos elevadores,
sugeriu que ficasse ali à saída para quando ela descesse. Assim foi, e
acompanhei a minha mãe à sala de espera da urgência. Entretanto, perguntei
pela médica que me telefonara, e esta atendeu-me de imediato. Prestadas as
informações e feitos os telefonemas internos e exteriores necessários,
explicou-me toda a situação e veio comigo ao pé da minha mãe para a
observar, fazendo-me algumas perguntas. Tranquilizou-me dizendo que o que
chegara até ao momento estava bem e que logo que recebesse os últimos
resultados me chamaria. Tudo isto se passou com a maior gentileza e atenção.
Quando voltei para junto da minha mãe, duas voluntárias, achando que ela
estava com frio, aconchegavam-lhe mais cobertores e punham um lençol
dobrado por baixo das pernas para ficar mais confortável. Pude estar com ela
o tempo todo. Era o final da amanhã, a nossa estada prolongou-se até perto da
uma da madrugada, com mais exames e observação. A equipa entretanto
mudou, mas fui informada disso e do que se sucederia. A qualidade de
tratamento não se alterou com a troca de equipa. Quando saímos, a minha mãe
levava um relatório detalhado de tudo o que se passara e um receituário com
os medicamentos que deveria tomar. Já ia medicada para a noite. Não
encontrei uma única falha, nem no profissionalismo, nem na forma como
lidaram quer com a minha mãe, quer comigo: médicos, enfermeiros,
voluntários, pessoal auxiliar. Dedicação, correcção, eficácia e gentileza.
Tínhamos estado no mesmo serviço anteriormente e não fora tão perfeito, não
havia pessoal, o serviço estava sobrelotado e quando a minha mãe era
chamada pelo altifalante para fazer algum exame, não havia ali ninguém para
a levar (ela estava deitada na maca, sem aparelho de ouvir e incapaz de fazer
fosse o que fosse com autonomia), mas felizmente estava eu e acompanhei-a
aos vários departamentos de exames. Foi um fim-de-semana inteiro. No
essencial, tudo decorreu como se esperava de uma urgência, do ponto de vista
dos cuidados médicos.
Possivelmente, da próxima vez, que espero demore muito tempo a chegar, não
será tão perfeito como agora, ou talvez sim. Mas sei que tudo farão para um
bom diagnóstico e um bom tratamento. Tenho a certeza de que a acolherão e
cuidarão dela da melhor maneira que lhes for possível. Sei que às vezes as
coisas não se passam assim. Sei-o por experiência própria e por ouvir contar.
Poderia narrar aqui uma ou outra história desagradável, contudo tenho muito
mais histórias bem-sucedidas. Mas o pior (e foi muito mau) que já me
aconteceu em termos de saúde, de consequências nefastas num caso, e poderia
tê-lo sido no outro, não aconteceu num hospital público. Não estou a tirar
ilacções, apenas quero dizer que, com todos os defeitos, temos um dos
melhores sistemas nacionais de saúde. A necessitar de acertos e
aperfeiçoamentos. Precisa de capital humano e… do outro. Para isso é
necessário investir, o dinheiro é para ser aplicado no que for prioritário. É
preciso racionalizar gastos, e dinheiro utilizado em parcerias com privados
deveria ser utilizado para melhorar o público. Isso sim, seria fazer render o
investimento. Deste modo é a fundo perdido. Precisamos de mais hospitais, de
mais pessoal, de mais instrumentos de saúde. Para que o SNS seja cada vez
mais autónomo e melhor. Como vamos vendo acontecer, apesar das
dificuldades que existem.
Sei de um médico sénior que recebe estagiários no seu serviço, e costuma
dizer-lhes que é muito importante, para o doente, que o médico seja feliz. Sei
de outro serviço em que os médicos se cotizaram para pagar a viagem a um
doente dos Palop, com alta e sem dinheiro para regressar. Não imagino isto
em mais lado nenhum. Por isso, e porque a saúde é o tema talvez mais
importante das nossas vidas, não é prudente deitarmos oportunidades pela
janela. Ainda que, consoante o caso, e cada um sabe de si, alguns tenham de
tomar sais de frutos. O mal menor.
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