2024-03-06
PELA SUA SAÚDE!


Risoleta C Pinto Pedro



Não é uma crónica sobre política, mas não deixa de ser uma crónica política, pois tudo o que trata da pólis a ela diz respeito.

Ficou-me daquele dia um nome: Drª Rita Matos. Uma jovem médica dos Hospitais Civis que nessa manhã me telefonou, ia eu já a meio da ponte a caminho de Lisboa. Pusera-me ao volante mal me ligaram informando que fora chamado o 112 para a minha mãe. A Drª Rita, que eu não conhecia de lado nenhum e vice-versa, que estava nessa manhã na urgência, precisava de algumas informações sobre os 94 anos da minha mãe, mas eu estava quase a chegar. Fora a voar por cima do rio!

Uma vez chegada ao Hospital e vencidas as necessárias burocracias da entrada, a minha mãe já fizera todos os exames e estava para descer depois  de completado o último. Um funcionário ia buscá-la e convidou-me a subir com ele, mas ficando a saber das minhas resistências em relação aos elevadores, sugeriu que ficasse ali à saída para quando ela descesse. Assim foi, e acompanhei a minha mãe à sala de espera da urgência. Entretanto, perguntei pela médica que me telefonara, e esta atendeu-me de imediato. Prestadas as informações e feitos os telefonemas internos e exteriores necessários, explicou-me toda a situação e veio comigo ao pé da minha mãe para a observar, fazendo-me algumas perguntas. Tranquilizou-me dizendo que o que chegara até ao momento estava bem e que logo que recebesse os últimos resultados me chamaria. Tudo isto se passou com a maior gentileza e atenção. Quando voltei para junto da minha mãe, duas voluntárias, achando que ela estava com frio, aconchegavam-lhe mais cobertores e punham um lençol dobrado por baixo das pernas para ficar mais confortável. Pude estar com ela o tempo todo. Era o final da amanhã, a nossa estada prolongou-se até perto da uma da madrugada, com mais exames e observação. A equipa entretanto mudou, mas fui informada disso e do que se sucederia. A qualidade de tratamento não se alterou com a troca de equipa. Quando saímos, a minha mãe levava um relatório detalhado de tudo o que se passara e um receituário com os medicamentos que deveria tomar. Já ia medicada para a noite. Não encontrei uma única falha, nem no profissionalismo, nem na forma como lidaram quer com a minha mãe, quer comigo: médicos, enfermeiros, voluntários, pessoal auxiliar. Dedicação, correcção, eficácia e gentileza. Tínhamos estado no mesmo serviço anteriormente e não fora tão perfeito, não havia pessoal, o serviço estava sobrelotado e quando a minha mãe era chamada pelo altifalante para fazer algum exame, não havia ali ninguém para a levar (ela estava deitada na maca, sem aparelho de ouvir e incapaz de fazer fosse o que fosse com autonomia), mas felizmente estava eu e acompanhei-a aos vários departamentos de exames. Foi um fim-de-semana inteiro. No essencial, tudo decorreu como se esperava de uma urgência, do ponto de vista dos cuidados médicos.

Possivelmente, da próxima vez, que espero demore muito tempo a chegar, não será tão perfeito como agora, ou talvez sim. Mas sei que tudo farão para um bom diagnóstico e um bom tratamento. Tenho a certeza de que a acolherão e cuidarão dela da melhor maneira que lhes for possível. Sei que às vezes as coisas não se passam assim. Sei-o por experiência própria e por ouvir contar. Poderia narrar aqui uma ou outra história desagradável, contudo tenho muito mais histórias bem-sucedidas. Mas o pior (e foi muito mau) que já me aconteceu em termos de saúde, de consequências nefastas num caso, e poderia tê-lo sido no outro, não aconteceu num hospital público. Não estou a tirar ilacções, apenas quero dizer que, com todos os defeitos, temos um dos melhores sistemas nacionais de saúde. A necessitar de acertos e aperfeiçoamentos. Precisa de capital humano e… do outro.  Para isso é necessário investir, o dinheiro é para ser aplicado no que for prioritário. É preciso racionalizar gastos, e dinheiro utilizado em parcerias com privados deveria ser utilizado para melhorar o público. Isso sim, seria fazer render o investimento. Deste modo é a fundo perdido. Precisamos de mais hospitais, de mais pessoal, de mais instrumentos de saúde. Para que o SNS seja cada vez mais autónomo e melhor. Como vamos vendo acontecer, apesar das dificuldades que existem.

Sei de um médico sénior que recebe estagiários no seu serviço, e costuma dizer-lhes que é muito importante, para o doente, que o médico seja feliz. Sei de outro serviço em que os médicos se cotizaram para pagar a viagem a um doente dos Palop, com alta e sem dinheiro para regressar. Não imagino isto em mais lado nenhum. Por isso, e porque a saúde é o tema talvez mais importante das nossas vidas, não é prudente deitarmos oportunidades pela janela. Ainda que, consoante o caso, e cada um sabe de si, alguns tenham de tomar sais de frutos. O mal menor.

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