Risoleta Pinto Pedro
Reflexões sobre a língua 1
Foi quando comecei a aprender latim e grego, o que aconteceu aos dezasseis anos, ainda no liceu, que comecei a ter noção de uma coisa que mais tarde encontrei pensada por alguns teóricos, que é o facto de a língua ser mais sábia do que aquele que a fala, ou pelo menos, o lado consciente do falante, não só porque a língua carrega toda uma história com ela, história de que pelo menos a maioria daqueles que a usam não têm consciência, como ela tem implícita toda uma tradição simbólica e oculta, diria mesmo mágica, de que não nos damos conta.
É neste sentido que a linguagem molda o homem.
Penso nisso às vezes, quando ouço as pessoas a falarem sem fazerem uma pequena ideia da complexidade de conceitos que as palavras que dizem contêm. Nem da força que elas transportam.
Isto aponta para uma coisa a que poderia chamar-se o carácter sacramental da língua.
Talvez seja por isso, pela imensa fé no processo evolutivo da língua e na evolução em geral, que a filosofia da linguagem que preside às modernas gramáticas, não pressupõe um carácter normativo mas descritivo, isto é, em vez de prescreverem como deve dizer-se ou escrever-se, limitam-se a descrever como que é o uso da língua pela maioria dos falantes. E se a função destas gramáticas é descrever a língua, a função da língua é descrever a realidade, ou aquilo a que nos habituámos a chamar realidade. Onde eu digo realidade, também podemos ler “ilusão”; nesse aspecto, a linguagem não faz distinções, tanto descreve a realidade como a ilusão. Cabe-nos a nós fazer a distinção.
(continua)
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