Risoleta
Pinto Pedro
Os funcionários de Deus |
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Tinha no meu tm um SMS de Helena:
“Mais uma manhã à conversa com os espalhadores de Deus…”. É assim que ela lhes chama.
Abordaram-na a meio da avenida. Dois homens, para lhe falarem da palavra de Deus. Ela não percebe o que se passa consigo, se tem escrito na testa “abordem-me”, para todos estes publicitários da palavra divina virem ter com ela, e não são só Testemunhas de Jeová. Ela compreende. Não têm uma máquina montada como as igrejas instituídas, e têm tanto direito como os outros de espalharem a tal palavra que já anda pelas ruas da amargura, mas também sabemos que às vezes (sempre?) é preciso bater no fundo. São os modernos evangelistas. Quem sabe se um destes não virá a ter o prestígio futuro de um São Mateus ou de um São Lucas e se ela, Helena, a céptica, não será a futura coroa de glória de um destes emissários, se não irá ser tema e motivo e título para um episódio desse futuro evangelho?
Helena, a céptica, não desiste de fazer perguntas incómodas para as quais os empalhadores (às vezes chama-lhes assim, porque considera que a maior parte dos espalhadores de qualquer religião mais não faz que cumprir a tarefa de apresentar Deus em versão embalsamada) não foram preparados, com que os desarma, mas com que não consegue que desistam (são mesmo homens de fé, ou de uma tremenda obsessão), e ao fim de vários quartos de hora de missionação inútil, o funcionário, à beira de um ataque de nervos, acaba por lhe dizer:
- Mas afinal quem é que está aqui a aprender?! Você quer aprender ou não?!
Olham-na como um caso perdido mas não desistem, apenas adiam para o próximo encontro. E ela não tem coragem para os mandar dar uma volta, nem eles coragem têm para prescindir desta passagem garantida para o paraíso. Não há como a vitória (ou a paciência) sobre um endemoninhado, para carimbar de seguida, várias páginas de um passaporte para o céu. Pensam eles.
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