2016-05-23, segunda-feira, 18h30:

apresentação por António Bondoso do livro
"Angola Noutros Tempos",
de Jerónimo Pamplona







Prefácio

Depois de ler o livro Angola Noutros Tempos foi com satisfação que aceitei o ónus de escrever o Prefácio. O livro, segundo o autor, é um livro de crónicas, contos e poemas. A descrição histórica, narrativa, humorística e poética, seguindo uma sequência cronológica, infere, de facto, o género. Todavia, o espaço geográfico e temporal a que nos remete a sua leitura é à África Subsariana, Ocidental, a Angola, entre 1482 / 1974, «pré-colonial», «colonial». Afigura-se-me que, para além das crónicas, contos e poemas que o texto oferece, estarmos perante um livro de reflexão histórica e cariz sócio antropológico. Sobre o relevo, as dimensões e a substância do devir da África nas suas particularidades e particularismos.

A Antropologia tem como postulado a unidade do género humano, tendo como objetivo o estudo do homem como um todo na sua diversidade cultural. Como é que, num determinado local, a relação entre uns e outros é assumida por uns e por outros? Esta relação entre europeus (portugueses) e africanos é uma constante na narrativa de Jerónimo. A “irracionalidade” africana do século XVI daria lugar ao “primitivo” do século XIX, concomitante com uma época de hegemonia europeia, predominantemente evolucionista e uma influência das ciências naturais sobre as sociais. O choque de culturas, a que se refere o autor, o “eu” e o “outro”, renegava o caráter de humanidade aos nativos, e era “por vezes” o justificativo da escravatura e da discriminação entre “civilizados” e “indígenas”, numa aculturação forçada por vezes violenta, é o reflexo do europeu colonizador acentuadamente etnocêntrico.

Dir-se-ia assim que o livro de Jerónimo, de leitura fluida, é um texto de algum modo etnográfico, no sentido em que revela costumes, crenças, tradições e línguas das diferentes etnias que vão aparecendo. É a síntese feliz de dois universos aparentemente distintos, o europeu e o africano, ou ainda, o colono e o colonizado. Opostos, por contraponto com a unidade do género humano. Feliz, porque apesar de um histórico atribulado, repleto de contradições e entropia, a nostalgia que transparece na leitura, resultado de uma intersecção (aculturação) mútua, tanto de europeus como de africanos, são uma evidência, nos contos e poemas descritos na parte final do livro: «porquê o Golungo perguntou-lhe o pai? Ora, porque estarei todos os dias convosco. Por outro lado, entusiasma-me a ideia de contribuir para o desenvolvimento da minha terra de adoção»

Paul Fernandes

Antropólogo




Posfácio

Este é um livro de crónicas, contos e poemas que percorre um tempo com início em 1482 e fim em 1974, através das seguintes etapas:

Na Introdução relato a evolução da África antiga, desde o aparecimento do Homo Sapiens passando pelo surgimento da agricultura até à fundição do ferro.

«Certo é que por volta de 400 a.C. a fundição era praticada na área da atual Nigéria e por volta de 1.000 d.C., outros povos da África Ocidental utilizavam igualmente esta tecnologia». Na primeira parte abordo a "chegada" dos portugueses a Angola.

Incidindo sobre o reino do Ndongo, detenho-me um pouco mais sobre a figura mítica da Rainha Njinga. No final da visita o Governador estranhou que a Embaixadora não chamasse a escrava que se mantinha imóvel sobre a almofada. Njinga riu-se. «Deixaria a escrava, retorquiu. Não tinha por habito usar do mesmo assento mais do que uma vez».

Na segunda parte descrevo as personagens e o estatuto dos Ambaquistas e dos Assimilados.

«Escrevo de nenhures. É este o meu solo materno pátrio; no qual busco a felicidade e me consolo».

Na terceira parte centro-me na vida económica e social do Golungo Alto em meados do século XX.

«No dia em que chegava o “homem da máquina” para passar o filme, o pessoal que quisesse assistir tinha que pagar o bilhete e levar um banco de casa, ou então sentar se no chão.»

Na quarta parte, num estilo em que a paródia prevalece sobre a sátira, revisitando mais de 25 anos, conto 42 “estórias/piadas”, que ocorreram em diferentes lugares de convívio e que são aqui compiladas.

«Para tomar banho?! Claro! Onde é que o Sr. toma banho? Eu?! Eu tomo banho no rio. No rio?! E os Jacarés? Oh, os Jacarés! Não há perigo. Já me conhecem!»

Na quinta parte narro seis contos, no estilo que poderá chamar-se de “short stories”.

«Ó Lia, tu tinhas de lhe dizer que aceitavas o namoro. Sabes, não parece mas, os homens são muito tímidos! Nós, mulheres, temos que, por vezes, tomar a iniciativa.»

Na última parte percorro, num “rally paper imaginário”, as ruas do Golungo Alto visitando lugares que nos fazem recordar afetos e emoções vivenciadas.



«Desde o Luínha para o Golungo lá seguiam;/ o comboio, automotora e a grazine assim andavam,/ devagar, devagarinho, nos morros e curvas até gemiam./ Algumas vezes, poucas, vejam lá, até descarrilavam!»



Jerónimo Pamplona



Biografia do Autor

Jerónimo Pamplona nasceu em 1942, na aldeia de Padroso, nas proximidades da serra do Larouco, Montalegre, onde viveu até aos onze anos de idade.

Para frequentar o ensino secundário foi matriculado no Instituto Militar dos Pupilos do Exército, em Lisboa, que frequentou até aos dezanove anos.

Em 1961 foi recrutado para o serviço militar obrigatório, em Sacavém, na Escola Prática do Serviço de Material. Ao fim de dois anos foi mobilizado para Angola, rumo a Veríssimo Sarmento, agora de novo Camissombo, na província da Lunda Norte, onde permaneceu catorze meses. Daqui seguiu para o Zemba, na região dos Dembos donde, após oito meses, foi enviado para Luanda. Ali, conheceu a mulher com quem vive até hoje. A paixão falou mais alto e decidiu ficar em Angola por mais dez anos, onde começou a trabalhar na indústria farmacêutica como delegado de informação médica e, mais tarde, como gerente de vendas para Angola e Moçambique.

Retornado a Portugal no dia da consoada de 1975, reiniciou a carreira na indústria farmacêutica, tendo desempenhado, praticamente, todas as funções nas áreas do marketing e vendas, reformando-se como diretor.

A afeição pela escrita foi descoberta no ano de 2013 na Nova Atena - Associação para a Inclusão e Bem-estar da Pessoa Sénior, pela Cultura e Arte, em Linda-a-Velha. Contribuíram para este “novo olhar” os professores Elisabete Castelo Branco (Escrita Criativa), Jorge Proença (Clube de Leitura), Luís Santos (Literatura Portuguesa) e Paulo Fernandes (Antropologia).