2024-03-14, quinta-feira, 14h30:
Lembrar o Padre Mário de Oliveira


Vídeos da sessão:


Intervenção de rui manuel grácio das neves


O MEU TESTEMUNHO PESSOAL
SOBRE
O PADRE MÁRIO DE OLIVEIRA


1. Conheci o Padre Mário de Oliveira na década dos noventa do século XX. Foi mais ou menos assim. Tinha dado uma conferência em Madrid, organizada pelo Comité Óscar Romero, pelos anos 90 ou 91 (regressei do Brasil a finais de 1989). Ao final da conferência, a Celeste e a Lina vieram falar comigo. Pelo acento da Celeste percebi logo que eram portuguesas e disse que podíamos falar em português. Houve um convite para poder falar em Portugal daquelas coisas que tratei, ficando assim uma relação que não adivinhava que iria durar por muitos anos, até hoje. Sempre em Solidariedade com a América Latina. E, se não recordo mal, estava presente também naquela ocasião o Bispo Sergio Méndez Arceo.

2. Quando vim a Portugal (morava naquela altura nos Dominicanos do Albergue de San Martín de Porres em Madrid e lecionava Teologia em Salamanca) comecei a tomar contacto com a Comunidade de S. Pedro da Cova, onde morava o Padre Mário, junto com outro pessoal solidário dos processos da América Latina e no trabalho de uma teologia popular em Portugal. Era mais na zona Norte do país onde estas comunidades existiam e levaram-me a visitar experiências nesta linha. O que eu queria sempre conhecer para quando vinha a Portugal! Certamente, aqueles anos eram anos mais intensos de atividades sociais, políticos e de procura de outros rumos dentro da Igreja.

3. A partir daí fiquei a ir conhecendo melhor o Padre Mário. As várias vezes que fui a S. Pedro da Cova permitiu-me ir falando com ele e lendo sobre ele, especialmente da altura dos seus conflitos como capelão militar nas colónias, os seus julgamentos posteriores, os seus escritos, a sua crítica radical de Fátima, a sua frontalidade na abordagem dos problemas religiosos e pastorais, a sua coerência entre vida e escrita. Ficou-me sempre a ideia de um padre valente, corajoso, crítico com os sistemas eclesiásticos e políticos, vivendo o seu empenho sempre com os mais oprimid@s e post@s à parte pelo Sistema económico-social-político-eclesiástico… Algumas vezes pensava que também podia resultar um pouco esquemático no seu pensamento e que era preciso mais concretização analítica, libertando-se do perigo de “chavões mentais”.

Mas o Mário de Oliveira (que nos deixou uma obra extensa) foi sempre um buscador de uma Igreja mais evangélica, daquela dos primeiros tempos do cristianismo, seguidora de Jesus de Nazaré, o Rapaz da Galileia, numa Igreja sempre com as e os pobres, com sensibilidade para as mulheres como as grandes oprimidas da História, e de uma Igreja crítica e transformadora deste mundo (capitalista e neoliberal e de idolatria do Mercado e do Capital) em que vivemos.

4. Por isso, o Padre Mário foi marginalizado e ostracizado pela Igreja Católica, que, infelizmente não o entendeu, nem pôde nem quis incorporar um pensamento auto-crítico. Especialmente a Igreja local, que carrega certamente aqui um pecado de humanidade e de integração do Diverso. Não souberam o que fazer com ele, e o que resultou foi porem-no à parte. Neste sentido, o Mário também foi profético, porque disse verdades muito contundentes, que a Hierarquia católica não estava disposta nem preparada para ouvir. Enfim, pecados eclesiais!

5. Resta-nos, a quem o conheceu, prosseguir esse empenho de ver alguém que dedicou toda a sua vida à Causa Maior do Reino, mais do que ao arrivismo eclesiocêntrico, e que por essa causa nos deve animar a todos e todas a viver um Evangelho mais comprometido, radical, de base, horizontal, laical, popular, crítico… lutando cada dia por um Mundo Melhor, mais justo, pacífico e inter-solidário! Descanse em Paz!

Obrigado, Mário de Oliveira!

Rui Manuel Grácio das Neves





Intervenção de Libânia Madureira


Padre Mário de Oliveira, também conhecido como Padre Mário da Lixa, foi muito mais do que um simples presbítero da Igreja do Porto. Sua vida e obra foram marcadas por uma profunda humanidade, compaixão e um compromisso inabalável com a justiça e a liberdade.

Nascido a 8 de Março de 1937, em Lourosa, filho da Ti Maria do Grilo e do Ti David, orgulhava-se de suas raízes, mas principalmente de sua ligação com a "Ruah" - o sopro de vida, o espírito que permeia a existência humana em sua plenitude. Desde cedo, mostrou-se um pensador atento à diversidade do mundo, cujo olhar acutilante e visionário o conduziu por caminhos muitas vezes desafiadores. Sempre quis viver na simplicidade dos pobres, compartilhando as suas experiências; jamais buscou poderes, especialmente os eclesiásticos, optando por se dedicar de corpo e alma à causa de uma humanidade mais justa e solidária.

Como presbítero, iniciou seu ministério em 5 de Agosto de 1962, na cidade do Porto. No entanto, seu papel transcendeu as paredes da igreja, abraçando uma missão que o levou a enfrentar os desafios mais prementes de sua época. Como professor de Religião e Moral nos Liceus Alexandre Herculano e D. Manuel II, no Porto, e Capelão Militar na Guiné Portuguesa, não hesitou em pregar o evangelho da paz, mesmo quando isso lhe custou a expulsão do território, após apenas quatro meses de serviço.

O compromisso de Padre Mário com os mais desfavorecidos da sociedade foi evidente em cada etapa de sua jornada. Como co-adjutor da Paróquia das Antas, no Porto, e pároco em Paredes de Viadores, Marco de Canaveses e Valadares, dedicou-se incansavelmente a evangelizar os pobres, o que lhe valeu exonerações e até mesmo prisões.

Após a Revolução do 25 de Abril de 1974, encontrou um novo caminho para expressar sua missão. Tornou-se jornalista-delegado do vespertino “República” e redactor principal de diversos jornais, incluindo “Página Um”, “Aqui” e “Correio do Minho”, antes de fundar e dirigir por mais de 22 anos o jornal “Fraternizar”.

Seu legado literário é vasto e fecundamente polémico, reflectindo sua busca incessante pela verdade e sua luta contra a ignorância e o obscurantismo. O "Livro dos Salmos, Versão TERCEIRO MILÉNIO", sua 40a obra, é um exemplo da profundidade de sua reflexão espiritual e seu compromisso com a renovação da fé.

No entanto, foi em seu compromisso com a justiça e a liberdade que o Padre Mário deixou sua marca mais indelével. Pároco de Macieira da Lixa, em Felgueiras, foi preso duas vezes pela PIDE e julgado por suas convicções. Sua resistência e coragem inspiraram muitos e continuam a ressoar numa sociedade que ainda luta pelos valores pelos quais ele dedicou sua vida. Hoje, seu legado vive, não apenas em suas obras e realizações, mas no espírito daqueles que continuam a buscar a verdade, a justiça e a liberdade!

Padre Mário de Oliveira foi, e continuará a ser, uma luz que guia os passos daqueles que se atrevem a sonhar com um mundo melhor... e que a sua obra, de mais de 50 livros publicados, capture a essência e o impacto do Padre Mário de Oliveira, bem como sua rica contribuição para a sociedade portuguesa e para além dela!

Neste meu jeito de ser (poeta), defino assim o meu amigo Mário:

"Em Louvor a Mário"

No crepúsculo dourado da lezíria,
ecoam os segredos d’um coração em desassossego.
Mário, o homem por excelência, irradia
a força serena de um abraço quebrando o sossego.
Jardineiro de estações infindáveis,
das planícies às alturas. Em teu caminho
semeaste a esperança em chãos incansáveis,
despertando a flor que brota no destino.
Na Primavera, teus olhos reflectem o brilho,
dos cristais que lavram a alma da terra.
Poema vivo, gerado no cadinho do trilho,
onde a vontade se ergue, mesmo sob a dor que encerra.
Teu olhar manso como a brisa da manhã,
a luz que se irradia... iluminando horizontes.
Voz que se ergue, desafiando a escuridão vã,
derrubando barreiras... rompendo frontes.
Expressão prolífica que suaviza as arestas,
com a honestidade de um coração em chama.
Como um vulcão, sua força contesta,
e a alma em forma de flecha... ao mundo proclama.
Querido Amigo Mário, em ti reside o refúgio
dos desfavorecidos, na palavra que persiste.
Tu és o farol no mar bravio... o abrigo,
onde a fé se sustenta... e a esperança existe!
Pedra viva da Igreja... firme e forte,
o seu alicerce é a fé... tua luz é a verdade.
Nas mãos do tempo... venceste a própria morte
Oh... lúcido cicerone... duma jornada de bondade!...
Libânia Madureira




Intervenção de Joaquim Murale


Bom dia, queridos amigos.

É sempre um momento feliz voltar à Unicepe e ao vosso convívio, de que guardo belas e gratas lembranças. Hoje voltamos aqui por uma razão que nos entristece a todos, celebrar a memória do Padre Mário de Oliveira, um homem diferente, corajoso, humilde, de mente brilhante, que soube preservar sempre o riso cândido e espontâneo de menino. Não fora o acidente que o vitimou e ainda hoje poderíamos contar com a argúcia do seu pensamento. Este homem simples, clarividente, que me deu a honra de me considerar seu “irmão gémeo nas grandes causas”, sempre tinha uma visão clara dos factos que influenciavam a vida e o mundo porque a sua mente era verdadeiramente livre, até das peias que, tantas vezes, impomos a nós próprios. O Padre Mário não se ajoelhava a altares, a um partido, a qualquer fonte de poder. Ele pugnava por uma mudança do mundo disseminando humanização através de algo semelhante a um sistema de vasos comunicantes, ou seja, dando-nos as mãos num fluxo de fraternidade cada vez mais amplo. E era irmandade o que a sua palavra espalhava, contra os poderes – o político, o religioso, o financeiro –, a favor dos pobres, dos fracos, dos desamparados, sem excluir desse caminho os que, como eu, pensavam de forma diferente e/ou eram ateus.

Conheci pessoalmente o Padre Mário em casa do nosso editor, amigo e irmão comum, Jorge Castelo Branco, e, não obstante a distância física que nos separava, tive a felicidade de partilhar com ele inúmeras iniciativas de carácter literário e cultural, algumas das quais aqui mesmo, na Unicepe.

Infelizmente, já não poderemos contar com a argúcia do seu pensamento para fazer luz sobre o tempo insano que vivemos. Um áspero tempo de marionetas em que políticos eleitos com o voto dos cidadãos aceitam ser, nos seus países, agentes dos interesses imperialistas. Têm nome e todos os conhecemos. Um deles condena à morte a juventude do seu povo apenas para que o seu país entre na NATO, ou melhor, para que a NATO tome conta do seu país. Outros não hesitam em impor sacrifícios aos seus povos para alimentarem uma guerra que tão-só visa alargar a globalização ao mundo e colocar nas mãos alemãs o controlo político sobre a Europa inteira. Vivemos um tempo ignóbil de mentira. Nunca a manipulação das mentes atingiu a proporção a que se assiste hoje em dia. Nunca a cegueira foi tão vasta, nem tão vasta a ignorância. Nunca a divisão entre os fracos foi tão funda. Nunca a insegurança no dia-a-dia foi tão palpável, nem tão palpável a desesperança no futuro.

A melhor homenagem que poderemos prestar ao Padre Mário de Oliveira, e certamente aquela que ele mais desejaria, é que o prossigamos, continuando no futuro a sua luta. E, nessa luta, não seguiremos em frente sem entendermos a realidade como ela é e não como nos é dada a ver.

No mundo ocidental globalizado, é um erro pensar que a vida dos povos depende dos resultados eleitorais. Em Portugal, nada de significativo mudou nos últimos dias. As pessoas são as mesmas. Apenas vai mudando o cenário consoante as circunstâncias, as decepções e as manipulações. Hoje temos o que tínhamos há uma semana atrás: as mãos vazias daquela liberdade que pode mudar os dias porque pode mudar a vida. Essa liberdade, a verdadeira liberdade, continua arredia, longínqua, nunca a tivemos. O que temos e mantemos é a mesma capacidade para lutar por ela. Verdadeiramente, foi só isso o que sempre tivemos porque a vida, em cada momento, será sempre exclusiva consequência da luta política e social.

Eu gostaria de vos falar de uma mudança significativa que está a acontecer na sociedade sem que nós tenhamos consciência do seu verdadeiro impacto no viver colectivo. O mundo caótico em que vivemos está a sofrer as mais rápidas mudanças da história humana. Tudo o que era seguro ficou precário. Nunca a própria natureza humana mudou tanto num espaço de tempo tão curto. Em poucas décadas passámos de uma sociedade neurótica, basicamente controladora, assente em comportamentos estáveis e rotineiros, fiel a valores de honra e a sentimentos de remorso, para uma sociedade psicopática, de indiferença e desapego, constituída maioritariamente por pessoas egocêntricas, conflituosas, irresponsáveis, imaturas, sem honra, sem culpa e onde as regras existem apenas para que os outros as cumpram. Quando estamos perante pessoas para quem o centro do mundo é o seu próprio umbigo, tal significa que nessas mentes os ideais de fraternidade não colhem eco nem apoio. Isso explica o maior interesse e a maior atracção dos jovens para com as organizações políticas de direita, que já é visível nos resultados eleitorais e mais se destacará em futuras eleições em Portugal e no mundo ocidental, onde o mesmo fenómeno acontece devido ao mesmo tipo de vivências e partilha da mesma cultura. O desaparecimento da família tal como a conhecíamos, que era a fonte da educação e acompanhamento permanente dos filhos até à idade adulta; os cacos em que se encontra a Escola, com o total desrespeito pela figura do professor; a precariedade das actuais relações afectivas na adolescência, que se quebram e se mudam como se muda de roupa, e a ausência de figuras públicas de referência inspiradoras de condutas dignas e coerentes, ditam o surgimento acelerado desta nova sociedade visceralmente individualista, infeliz, violenta, manipuladora, sem afectos e alimentando todo o tipo de dependências. Os ideais humanistas sofrerão um duro revés neste contexto e as organizações de esquerda serão severamente esquecidas nos actos eleitorais. Deveras preocupante, também porque a criminalidade violenta e a conflitualidade geral aumentarão significativamente.

Isto conduz-nos a outro tema de premente reflexão. No mundo actual, os cidadãos apenas elegem os títeres que hão-de aplicar no seu país as condições que têm permitido à globalização avançar. São outros, bem longe de nós, os que comandam as multinacionais que controlam a economia global, que estão a traçar o futuro para o mundo. A perda de soberania aconteceu aquando da adesão à União Europeia e acentuou-se desde a queda do muro de Berlim. Esse muro simbolizou, aos olhos das populações, a separação entre dois sistemas políticos. A sua queda simbolizou também a falência do bloco socialista da Europa de Leste e o fim factual da Revolução de Outubro. Enquanto a esquerda não entender, assimilar e aprender das causas que levaram à degenerescência ideológica e consequente derrota do projecto mais fracturante, arrebatador e brilhante da história da humanidade, que encheu de esperança o coração dos pobres e desamparados do mundo, não é fácil voltar a atrair os povos para um caminho que abortou e todos os passos que dermos serão em vão. Lembremo- nos que foi a queda do muro de Berlim que promoveu a imediata intenção imperialista de transformar o mundo numa aldeia global. Tudo o que tem acontecido desde aí tem sido orquestrado, passo a passo, medida a medida, pelo grupo de Bilderberg e pelas cimeiras do Fórum Económico Mundial em Davos. A democracia em que vivemos nada mais é do que uma farsa para assegurar que nos mantemos bem divididos, cada um entrincheirado no seu partido, fiel à sua ideologia, em estado puro, para que se não cumpram os interesses dos mais desfavorecidos nem se alcancem os objectivos que, nas sociedades capitalistas, injustas e desiguais, deveriam unir-nos a quase todos.

Quis o acaso que a partida do Padre Mário coincidisse com o início do conflito europeu na Ucrânia. Pela primeira vez na História estamos a assistir a algo novo: a uma guerra não-declarada dos países integrantes da NATO contra a Rússia em que os aliados são representados por um país terceiro, a Ucrânia. E, a breve trecho, se esta guerra terminar favoravelmente aos interesses globais, outra guerra idêntica começará. Será contra a China; os mesmos aliados, a que se juntarão o Japão, a Coreia do Sul e outros países do extremo oriente, representados na guerra por Taiwan. Todos nós sabemos que será assim porque todos estamos a ser testemunhas da montagem do cenário. Destes conflitos destacam-se a cobardia política do ocidente para assumir a guerra, a concertação rigorosa de todos os meios de comunicação social, públicos e privados, e a consequente manipulação, quase diríamos científica, da mente e da opinião dos cidadãos que, ao invés de notícias e factos, estão a ser bombardeados permanentemente com mentiras, meias-verdades e propaganda.

Por isso, o programa de luta que nos espera no imediato parece óbvio: -- A necessária e urgente criação de um órgão de comunicação isento, independente e livre dos poderes político e económico, com efectiva abrangência nacional, que difunda noticiários e muita, muita cultura. Sem esse passo, absolutamente fundamental, muito dificilmente sairemos desta teia; -- A exigência da saída de Portugal da NATO e da União Europeia, porquanto são organizações que, sem princípios e sem coerência, recorrem à mentira e à agressão em prol da extensão e consolidação da globalização a todos os recantos do planeta. Um dos exemplos mais descarados da sua incoerência e do seu belicismo é o roubo do Kosovo à Sérvia, perpetrado em nome de direitos humanos que, por sua vez, não se reconhecem nos territórios palestinianos, onde Israel comete as chacinas que entende, sem sofrer uma única sansão, nem nas regiões de maioria russa da Ucrânia;

-- Estarmos de sobreaviso e preparados contra os efeitos nefastos que a 4a Revolução Industrial, em curso, irá trazer no imediato e no breve trecho. Já se divulga na imprensa o impacto, em número de desempregados, que a Inteligência Artificial acarretará. E o panorama é assustador! Desta vez, a substituição do homem será uma realidade em todas as áreas de actividade humana, incluindo nas profissões criativas! E se é verdade que o progresso científico deverá ser desejável e bem-vindo, é fácil imaginar as consequências em termos de milhões de desempregados que trará ao mundo inteiro. Enquanto isso, os lucros das multinacionais aumentarão de forma inimaginável. E é bem possível que a implementação maciça da Inteligência Artificial traga com ela novas e mortíferas pandemias. Os laboratórios onde os vírus se produzem trabalham em sintonia com o dito progresso, saberão colocá-los no mundo na hora certa, para reduzir a população e evitar que multidões de desempregados coloquem o capitalismo em risco;

-- Lembrar o Padre Mário também deverá dar-nos consciência de que a luta não é por conquista de lugares neste poder, mas para derrubá-lo. Haverá outra maneira de construir um mundo humano?

Pelo pouco que sabemos e, principalmente, por tudo o que se prepara nas nossas costas que nem sequer imaginamos, o porvir vem carregado de inquietações e nuvens negras. Se quisermos ter uma palavra a dizer sobre o futuro é imperioso resistir ao modelo de mundo que nos está a ser imposto. Comecemos a resistência pela educação dos filhos, com valores humanos, com firmeza, com regras, com limites, com bons exemplos e também com muito amor, e sabendo dar as mãos ao outro, aos outros, ao jeito de vasos comunicantes preconizado pelo Padre Mário de Oliveira, na partilha de sentimentos e emoções e na luta por objectivos comuns de justiça social, igualdade, liberdade e paz no mundo. Essa é a única democracia em que eu verdadeiramente acredito!

Saibamos, pois, honrar-lhe a memória em cada acto do nosso dia-a-dia, por mais simples que seja, semeando afecto, espalhando solidariedade, despertando consciências!

Agradeço a honra do convite para estar presente nesta homenagem. É uma felicidade estar ao lado de amigos, entre amigos, a falar de um amigo que continuará a ser muito querido para todos nós! Agradeço o acolhimento afectuoso da Unicepe. Agradeço a todos vós por terem vindo. E agradeço por me deixarem partilhar convosco algumas preocupações que, tenho a certeza, seriam também preocupações do Padre Mário. Deixemo-nos, então, sem reservas, tocar pelo exemplo das suas práticas fraternas! Ousemos prossegui-lo! Obrigado, queridos amigos, pela vossa atenção. Desejo-vos as maiores felicidades!

Joaquim Murale
Porto, Unicepe, 16 de Março de 2024.





Intervenção de Nelson Ferraz


MÁRIO

quando num longínquo ano entraste pela primeira vez
naquele liceu no nosso liceu todos percebemos que eras capaz de rasgar as cortinas
ensinando que todas as perguntas podem ser portas.

mas foste mais longe: abriste brechas na penumbra daqueles tempos.
e os meninos da sala disseram que eras diferente. e chamaram-te amigo.
e ficaram com aqueles dias adolescentes vida fora.

depois seguiste o caminho o teu caminho fazendo diferenças na ordem desordenada
das instituições.
e a tua liberdade era uma liberdade de carne e osso
como de carne e osso era o Jesus que te fazia menino.
um menino corajoso. tu.

a tua obra fundiu-se em ti. uma humanidade que querias distribuir
como se fosse uma bula grátis.

e falaste sempre sobre o amor e a fraternidade imprescindíveis
aos seres que somos ou deveríamos ser.

avisaste toda a gente sobre a necessidade de sermos justos.

e humildes. e verdadeiros na simplicidade da conduta.

e combateste a verdade falsa dos ventos do poder.
renegaste o oiro e os pontos cardeais da existência vulgar.
com um sorriso. com uma serenidade inquieta.
e disseste mil vezes não ao silêncio fácil.
por vezes viram-te como messias.
por vezes muitas como sacrílego.
penduraste a religião no cabide das histórias.
talvez para salvar Jesus.

exemplificaste como se faz. do início ao fim.
foste o que disseste que era preciso ser-se.
e isso, Mário, é de se tirar o chapéu.

Nelson Ferraz















LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS LIVROS DISCOS