Extraído da introdução do diretor do Instituto Italiano de Cultura de Lisboa,
Stefano Scaramuzzino, do catálogo para a exposição:
“A exposição nasceu de uma ideia, de um desejo e de uma vontade. A ideia de
deixar um testemunho tangível da exposição nascida da união de forças do
nosso Instituto e do Panteão Nacional por ocasião das Comemorações do
Cinquentenário do 25 de abril. O desejo de que a sua circulação rompa os
limites temporais desta efeméride e amplie a sua mensagem. A vontade de
renovar a adesão das nossas instituições aos valores do 25 de abril, italiano e
português.
Embora os acontecimentos retratados pela objetiva do fotógrafo tenham
ocorrido 15 meses após a Revolução dos Cravos, entendemos o 25 de abril no
seu sentido dilatado, que vai até ao outono de 1975, considerando a ocupação
das terras alentejanas no verão desse ano como uma natural consequência da
afirmação das exigências democráticas de igualdade formal e substancial, que
estava na base do golpe dos Capitães e das constituições italiana e
portuguesa.
Acontecimentos entrelaçados e paralelos, unidos pela euforia, pela
organização, pela desilusão e, finalmente, pela “ressaca”, mas destinados a
oferecer um exemplo duradouro com a demonstração de que a utopia era
possível, suscitando o interesse mundial pelo sucedimento mais importante dos
últimos anos (como o definiu Jean-Paul Sartre) e exercendo uma atração
particular sobre os intelectuais italianos, incluindo Fausto Giaccone.
Os rostos, as massas e as paisagens retratados pela sua objetiva implicavam a
ideia de que todas as relações económicas e de poder, por mais seculares que
sejam, são um facto humano que pode ser modificado pelo homem. A sua
publicação e difusão, hoje como ontem, toca as cordas de Itália porque nelas
nos espelhamos, reconhecendo a nossa história cultural e política: o
ecossistema de uma Sardenha que já não existe, o alento ideal de Carlo
Pisacane e dos Irmãos Bandiera, um final feliz para o conto Libertà de Giovanni
Verga e para o massacre de Portella della Ginestra, o desejo sonhado no final
do Calderón de Pasolini, os enredos surpreendentes de La Storia de Elsa
Morante.
É por isso que acreditamos firmemente neste projeto e na sua capacidade de
deixar um marco, aprofundando os laços luso-italianos, em continuidade e
coerência com a programação antiga e recente do Instituto. Por um lado, já em
1988 as instalações da nossa sede acolheram a exposição Fausto Giaccone,
graças à intuição de Antonio Tabucchi, que escreveu a introdução ao volume
Una História Portuguesa. Por outro lado, no momento em que escrevo, a
exposição produzida pelo nosso Instituto sobre o fotógrafo Uliano Lucas, que
também esteve em Portugal nos dias cruciais da Revolução e da luta de
libertação na Guiné-Bissau e em Angola, está a partir rumo ao Brasil, depois de
duas exposições bem sucedidas no Museu do Aljube, em Lisboa, e no
Convento de São Francisco, em Coimbra.
O desejo é que depois da exposição no Panteão Nacional, não lugar de morte,
mas de renascimento luminoso, o percurso de Fausto Giaccone e da sua
mostra encontre uma continuação natural no regresso às terras onde tudo
começou, cujos municípios, não por acaso, aceitaram colaborar na realização
deste catálogo: obrigado às vilas de Coruche e de Couço e à cidade de
Montemor-o-Novo, e obrigado ao Panteão e ao seu diretor Santiago Macias
pela partilha enérgica deste projeto, deste sonho, desta utopia.”
Julho de 2024
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