2017-02-10, sexta-feira, 18h30: Apresentação do livro "pudorgrafia", de suzamna hezequiel
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Sobre o “pudorgrafia” Excerto da apresentação de Danyel Guerra

“Uma força, leia-se inspiração, que é estranha porque se origina nas entranhas do corpoético e se projeta, tal como fósforo-foguetão, palavra (ar)riscada e acesa, em direção ao campanário luminário das estrelas. Uma força que, nunca abdicando de ser estranha, por bom fim, em nosso corpo se entranha.
Confirmando os bons auspícios anunciados em 'paradox.sou' (2010), 'pudorgrafia' (2015) se metaforiza numa caixa de fósforos, que suzamna vai (ar)riscando e acendendo, sem ter medo do estranhamento venturosamente deflagrado por estes incandescentes pontos de lume, de luz de iridescente cor poesia.
Concebidos, escritos, editados no curso de um íntegro e integral pundonor autoral, estes vigorosos corpoemas, na aparência epidermicamente opacos são, na realidade, profundamente hialinos. Pudorgrafias que expõem estar a corpoetisa disponível para continuar a desafiar e a desafinar, com suas paradoxias ontológicas, "o coro dos contentes".”

Texto de apresentação de Eduardo Leal

"Com a poesia não se diz o concreto dos dias, nem as evidências, nem o lugar comum. Ela não transforma o mundo no imediato das revoluções. Inquieta. Serve, com maior ou menor cuidado, para ilustrar o que nos é para além, o que nos ultrapassa e, apesar disso, nos é intrínseco.
Sobre as palavras, importa conter as próprias palavras, até porque, como neste livro, pudorgrafia, é pelo pudor com que se vestem, com que se combinam e como se desenham que se revelam e nos despem.
Este segundo livro da suzamna, agora editado pela Texto Sentido, é o lugar onde ela mesma se transforma, à medida que se diz e o vamos lendo, afirmando a impossibilidade de dizer de forma unívoca e a outra impossibilidade maior, a de guardar as palavras.
Porque a poesia também é paradoxo. E porque a poeta é a própria poesia."

Pudorgrafia: 5 modos de usar

1. Pudorgrafia é um manual de subjectividade aplicada que, apesar de não ocultar a sua inclinação doutrinal (leia-se a epígrafe de Harold Bloom cirurgicamente inscrita na badana: “A subjectividade profunda não é fácil – é muito difícil –, é aquilo que queremos cultivar nas pessoas”), mantém os seus “ensinamentos” sob uma aura abrupta e desalinhada, tornando-os, portanto, impossíveis de ser veiculados pelos métodos tradicionais.

2. A linguagem poética emerge, por isso, para que a polifonia do mundo seja representada em todo o seu caótico e por vezes trágico esplendor. As vozes que percorrem este livro pretendem abarcar o mundo e expressam um desejo violento de totalidade. Diante da omnipresente consciência da morte (do vazio, da perda, da dissipação), mas também da capacidade de reinvenção e “reabsorção”, o sujeito poético ensaia “a palavra inteira”, de modo a minimizar essa via dolorosa que desemboca inevitavelmente na “convivência com o fim”, prática corrente e eixo (des)estruturante do quotidiano e da vida;

3. O livro divide-se em quatro partes e permite a navegação entre géneros e temas de etiologia muito díspar: poemas mais ou menos “canónicos” convivem de perto com narrativas de expressão absurda e surrealizante; fragmentos auto-ficcionais e experiências revivalistas (o diálogo com a poesia visual é frequente); momentos de um esoterismo instruído, mediado pelo distanciamento irónico; cesura deliberada de palavras para libertar efeitos semiológicos e motivar as relações entre forma e conteúdo, ficando, neste caso, o poema reduzido (ou ampliado) a um ícone (veja-se, como exemplo, Whatever does not exist).

4. Se, por um lado, o mundo parece acontecer não raras vezes no poema como se de uma catástrofe natural se tratasse, com tudo o que uma catástrofe natural pode oferecer de novo para a sua releitura e reavaliação, por outro lado, as marcas de uma auto-consciencialização sempre muito lúcida e precavida remetem-nos para a ideia de que tudo é artefacto, construção, desconstrução, renovada contingência e programada profecia. A certa altura, pode ler-se: “pois, / o que / evolu- / ímos / N.Ó.S. / além / do plágio?”. A autora parece quer dizer-nos que o gigantismo do mundo (em todas as suas acepções e realidades) é, de facto, pornográfico e que a linguagem que o representa e descreve, por mais inovadora ou transgressora que seja, acaba sempre por ficar – se e sempre que é consciente de si – retraída. Há também um imenso pudor em nomear o mundo. Pudor perante a agressão e o desejo, a beleza e a fatalidade, mas sobretudo pudor perante a discrepante totalidade e a nossa infinita imperícia.

5. No entanto, neste breve livro há ainda espaço para: pequenas notas obituárias; insinuações eróticas e ambientes florais; cartas de amor, princípios taoistas e espaços reconhecíveis; uma deriva entre mestres e enunciados físicos; fortes alusões a templos, colunas e milagres; uma brisa vulcânica de desejo e decepção; o discurso enfatuado de um gato; léxico pop e erudito; caminhos despudoradamente inextrincáveis; uma vontade de extravasamento e de readequação nominal; conjugações, mistificações e fotografias; palhaços, “palarvas”, oráculos e franchisings.

Nota Biográfica

suzamna hezequiel (aka Suzana Guimaraens) nasceu no Porto em 1972 e vive em Vila Nova de Gaia. Licenciou-se em Coimbra, em Línguas e Literaturas Modernas, e especializou-se em Educação Especial. Leciona há 20 anos, atualmente Inglês. Professa, contudo, a máxima de Joseph Beuys: “cada homem é um artista”, incursando, por essa razão, por distintas formas de expressão no sentido da autodescoberta e da exploração do Ser. Editou três livros, entre a prosa poética, a poesia e o conto: “Sonho Partilhado” (2000), “paradox.sou” (2010) e “pudorgrafia”(2015). Dizedora em alguns contextos poéticos, em Portugal e na Galiza, como são disso exemplo as "Quintas de Leitura" e o "Círculo Poético Aberto".
Explora, transdisciplinarmente, a fotografia performativa e o teatro com adolescentes em contexto escolar.


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