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Primeiro editor de Neruda foi “O livreiro de Santiago”


por Soares Novais



Manuel Carlos Jorge Nascimento, português da ilha do Corvo (1885-1966), foi o primeiro editor de dois autores chilenos galardoados com o Prémio Nobel da Literatura: Gabriela Mistral (1945) e Pablo Neruda (1971).

De Mistral, Nascimento publicou “Desolacion” (1923); e de Neruda “Veinte Poemas de Amor e Una Canción Desesperada” (1924). Postas as coisas assim, até pode parecer que a vida deste natural da mais pequena ilha dos Açores, que apaixonou o portuense Raul Brandão, foi feita por um caminho isento de ciladas e de perigos.

Nada disso. Neto e filho de baleeiros, Manuel Carlos Jorge Nascimento nasceu pobre, muito pobre. Mal lhe surgiram os primeiros pêlos na cara, emigrou para os Estados Unidos da América. Já lá viviam alguns dos seus irmãos e por lá fica por algum tempo, mas com um único fito: juntar o dinheiro necessário para que possa rumar a Santiago do Chile e conhecer o seu tio Juan e a livraria que este gere.

O futuro editor de Gabriela Mistral e de Pablo Neruda desembarca em Valparaíso e é assaltado pela segunda vez. A primeira foi durante a viagem. Vale-lhe o cônsul de Portugal naquela cidade que lhe dá o dinheiro necessário para rumar à capital chilena.

Ali chegado, procura seu tio, Juan Nascimento. A sua livraria está recheada de obras de Shakespeare e de Camilo Castelo Branco, de quem é admirador confesso. O tio não acredita que tenha sido assaltado duas vezes e Manuel Carlos zarpa para Concepción, onde arranja emprego numa casa de penhores dirigida por um português. Então, começa a construir a sua vida. Casa com uma colega e, finalmente, vive dias felizes. Manuel Carlos Jorge Nascimento passa a ser conhecido por Carlos George Nascimento.

A 3 de Fevereiro de 1917, morre o seu tio, que não tem ascendentes nem descendentes. Os sobrinhos de Juan são os seus herdeiros. Carlos George adquire a parte dos herdeiros ausentes e instala-se em Santiago. Assume a direcção da livraria e torna-a rendível. Funda a Editorial Nascimento. Está prestes a cumprir-se a previsão da cartomante que, à sua chegada a Valparaíso, confirma ou vaticina o seu gosto pela leitura e pelos livros. (George abalara do seu Corvo natal com uma edição de “Os Lusíadas”, entre os seus parcos haveres).

A Editorial Nascimento passa a editar alguns dos nomes maiores da literatura chilena: Gabriela Mistral, Pablo Neruda, Andrés Sabélia, Francisco Encina e Pedro António Gonzalés. Em 1944, morre a sua mulher – Rosa Elena Marquez –, com quem sempre trocava impressões e que era sua cúmplice no gosto pela leitura.

Carlos George só regressará ao Corvo em 1948, para um breve visita. Acaba por falecer a 12 de Janeiro de 1966, em Santiago do Chile. O seu filho Carlos assume a direcção da editora e o académico Isidoro Vásquez de Acuña Marquês García del Postigo dedica-lhe um livro intitulado “O Corvino Carlos G. Nascimento, co-arquitecto das Letras Chilenas”.

É esta vida apaixonante de um editor que lia os originais até altas horas da madrugada, e depois os transformava em livros cuidadosamente editados, que o genial Zeca Medeiros nos dá a conhecer em “O Livreiro de Santiago”.

“O Livreiro de Santiago” é um filme notavelmente poético realizado por José Medeiros, açoriano, de Vila Franca do Campo, na ilha de São Miguel, o qual é também um dos protagonistas desta narrativa ficcional. David Medeiros, seu filho, é Carlos George na juventude. Maria do Céu Guerra, Filipa Pais, Jorge Palma e Carlos Guerreiro integram um elenco constituído maioritariamente por actores açorianos.

Pode ainda ver o “trailer” do filme “O Livreiro de Santiago”:

14/07/2022

Soares Novais

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