Espaço Associados



      


Evocando o Principezinho


por Regina Gouveia







(…)
- Gosto muito do pôr do sol. Vamos ver um …
- Mas é preciso esperar...
- Esperar o quê?
- Esperar que o Sol se ponha.
-Tu fizeste um ar de surpresa e, logo depois, riste de ti mesmo. Disseste-me:
- Eu imagino estar sempre em casa...
-De facto. Quando é meio-dia nos Estados Unidos, toda a gente sabe que o Sol se está a pôr em França. Bastava poder chegar a França num minuto para se assistir ao pôr-do-sol. Infelizmente a França fica longe demais. No teu planeta pequenino bastava apenas recuar um pouco a cadeira. E vias quantos crepúsculos quisesses….
-Um dia vi o Sol pôr-se quarenta e três vezes!
(...)

In o Principezinho, Sait-Exupéry

O pôr do Sol é uma das inúmeras maravilhas com que a natureza nos brinda.

(…) Põe-se o Sol porque o seu movimento é relativo.
Derrama cores porque os meus olhos vêem.
Mas por que será belo o pôr do sol?
E belo, para quê? (...)

In Poema das coisas belas, António Gedeão

O fenómeno é explicado com base na dispersão de Rayleigh. Uma explicação sumária do fenómeno, bem como uma simulação do mesmo ao alcance de qualquer um, podem ser encontradas em http://www.scielo.br/pdf/rbef/v32n3/v32n3a13.pdf

O principezinho poderia simular quantos pôr do sol quisesse….

Um outro fenómeno belíssimo, inspirador de poetas e não só, é o arco-íris.

Uma tarde o Tóino
chegou ao largo com um vidro extraordinário.
Segurava-se entre o polegar e o indicador,
virado para o sol,
e do outro lado chispavam as sete cores do arco-íris!
E nós, em volta, esquecidos do jogo do pião!...

In Poemas da Infância, Manuel da Fonseca

Colho esta luz solar à minha volta,
No meu prisma a disperso e recomponho:
Rumor de sete cores, silêncio branco.
Como flechas disparadas do seu arco,
do violeta ao vermelho percorremos
O inteiro espaço que aberto no suspiro
Se remata convulso em grito rouco.
Depois todo o rumor se reconverte
tornam as cores ao prisma que define
À luz solar de ti e ao silêncio.


Física, José Saramago,

“Simular” um arco-íris está também ao alcance de qualquer um, como se pode ver em http://www.apolo11.com/espectro.php

Este belo fenómeno da natureza foi explicado pelo inglês Isaac Newton (1642 -1727), um dos físicos mais famosos de todos os tempos. Usando um prisma de vidro criou um arco-íris num quarto escuro. Newton não foi o primeiro a criar um arco-íris artificial com um prisma, mas foi o primeiro a usá-lo para demonstrar que a luz branca é uma mistura de diferentes cores.

A Natureza é pródiga em maravilhas, nomeadamente paisagens deslumbrantes, variando com a região do planeta, a estação do ano, ...e nas quais a cor desempenha um papel fundamental.

Em Danxia, na China,
a natureza derramou nos montes
uma miríade de cores.
Por entre céu e terra,
tropeça o olhar
embriagado.

in Quando o mel escorre nas searas, Regina Gouveia

As folhas dos plátanos desprendem-se e lançam-se na aventura do espaço,
e os olhos de uma pobre criatura comovidos as seguem.
São belas as folhas dos plátanos quando caem, nas tardes de Novembro
contra o fundo de um céu desgrenhado e sangrento.
Ondulam como os braços da preguiça no indolente bocejo.
Sobem e descem, baloiçam-se e repousam,
traçam erres e esses, cicloides e volutas,
no espaço escrevem com o pecíolo breve,
numa caligrafia requintada, o nome que se pensa,
e seguem e regressam, dedilhando em compassos sonolentos
a música outonal do entardecer.
São belas as folhas dos plátanos espalhadas no chão.
Eram lisas e verdes no apogeu da sua juventude em clorofila,
mas agora, no outono de si mesmas,
o velho citoplasma, queimado e exausto pela luz do Sol,
deixou-se trespassar por afiado ácidos.
A verde clorofila, perdido o seu magnésio, vestiu-se de burel,
de um tom que não é cor, nem se sabe dizer que nome tenha,
a não ser o seu próprio, folha seca de plátano.
A secura do Sol causticou-a de rugas, um castanho mais denso
acentuou-lhe os nervos,
e esta real e pobre criatura vendo o solo coberto de folhas outonais
medita no malogro das coisas que a rodeiam:
dá-lhes o tom a ausência de magnésio;os olhos, a beleza



Para explicar o comportamento da luz em fenómenos como a reflexão, a refração e a decomposição nas cores do arco-íris, Isaac Newton admitiu que a luz seria composta de minúsculas partículas. A teoria tinha alguns pontos fracos, nomeadamente não conseguia explicar a propagação da luz no vazio. Huyghens (1629-1695), físico neerlandês, contemporâneo de Newton, embora um pouco mais velho, propôs um modelo ondulatório para a luz, segundo o qual esta, tal como o som, seria uma onda. O modelo explicava a reflexão e a refração da luz , que a ser uma onda deveria sofrer difração , o que nunca se observara.

Por volta de 1801, uma experiência realizada por Thomas Young (1773-1829) resolveu a questão favoravelmente a Huygens. A experiência de Young provou que a luz sofria difração, pelo que seria uma onda. No entanto, a propagação da luz no vazio continuava a não ter explicação. Imaginara-se uma substância, o éter luminífero, que preencheria todo o universo e onde as ondas eletromagnéticas se poderiam propagar. Um tal meio teria necessariamente propriedades muito estranhas. Ao resolver um problema, o éter criava vários outros. Hoje sabemos que o éter não existe A inexistência do éter viria a ser confirmada em 1887, pela experiência de Michelson–Morley que pode encontrar-se sumariamente descrita em http://especialmente.com.br/ciencia/astronomia/experimento-de-michelson-morley/. Hoje sabemos também que a luz é uma onda eletromagnética e, como tal, pode se propagar no vácuo.

Quando a teoria ondulatória parecia impor-se definitivamente, o físico Heinrich Hertz (1857-1894), durante as suas pesquisas sobre ondas eletromagnéticas, descobriu em 1887 o efeito foto-elétrico, que consiste na possibilidade de, sob a incidência de luz, uma superfície metálica emitir eletrões. Este fenómeno não pode ser explicado admitindo a natureza ondulatória da luz. A Física Clássica não foi capaz de dar uma explicação satisfatória para o fenómeno. Somente em 1905, Albert Einstein (1879-1955), com apenas 26 anos, o interpretou propondo uma nova teoria a respeito da natureza da luz. Segundo Einstein, a luz e as demais ondas eletromagnéticas são formadas de pequenos corpúsculos, não de matéria mas de energia. Por esse contributo inestimável, recebeu o Prémio Nobel de Física em 1921.

A luz manifesta assim um carácter dual: propaga-se como onda, sofrendo reflexão, refração, interferência , difração, mas comporta-se como corpúsculo quando interage com a matéria.

São ondas ou corpúsculos? Sim ou não?
São uma ou outra coisa, ou serão ambas?
São “ou” ou serão “e”? Ou tudo se passa como se?
Percorrem velozmente órbitas certas
as quais existem só quando as percorrem.
Velozmente. Será?
Ou talvez não se movam, o que depende
do estado em que se encontre quem observa.
Assim prosseguem rotineira marcha
na paz podre do tempo. Oh! O tempo!
Até que, de repente,por exigências igualmente certas,
num sobressalto histérico, saltam da certa órbita
e vão fazer o mesmo noutra certa tão certa como a outra.
E assim prosseguem na paz podre do tempo.
Eis senão quando,como pedra num charco ou estrela que deflagra,
irrompem no vazio,
e o vazio perturbado afunda-se e alteia-se
e em esferas sucessivas, pressurosas,
vão alagando o espaço próximo depois o mais distante,
e seguem sempre, sempre, avante, sempre avante,
em quantas direcções se lhe apresentam. Sim, ou não?
Estou à janela e vejo muito ao longe a linha do horizonte.
Ser ou não ser? Eis a questão.


Poema de ser e não ser, António Gedeão

Mas, afinal o que é a cor?

A cor, o que é afinal? Energia, no essencial.
É emissão de fotões, é um salto de electrões,
absorções, emissões, ou também interacções
entre a luz e a matéria. Pode ser sublime, etérea.
Ela é interferência é período, é frequência
ela é excitação, e logo desexcitação,
ela é inspiração na paleta do pintor.
Afinal o que é a cor?
É o vermelho de Almada? É o azul de Chagall?
Seja ela tudo ou nada, a cor é fundamental.
Seja no azul do mar, que às vezes é cor de breu,
seja no azul do céu ou no verde de um olhar,
seja no roxo dos montes, seja no cinza das fontes,
nas searas amarelas, perturbantes de tão belas,
seja no verde das plantas, no colorido das mantas,
seja em janelas, portadas, seja em telhados, fachadas,
em azulejos, vitrais ou em tantas coisas mais,
a cor é fundamental.
O que é a cor afinal? Energia, no essencial.

Cor, Regina Gouveia

A cor de um objeto resulta da interação da luz com o mesmo. Assim vai depender dessa interação que, por sua vez, vai depender da natureza da luz e da natureza do objeto. Já todos nos apercebemos, com certeza, que ao comprarmos uma peça de roupa, a cor que aparenta na loja nem sempre coincide com a cor que que “exibe” quando a observamos posteriormente no exterior. Há ainda um terceiro fator: o observador. Provavelmente o que significa vermelho para uns, não significará o “mesmo” vermelho para outros. E nesta dependência do observador temos os diversos “graus” de daltonismo, com diferentes dificuldades na perceção de cores

Na sequência destas considerações sobre a cor termino com Alberto Caeiro .

Passa uma borboleta por diante de mim
E pela primeira vez no Universo eu reparo
Que as borboletas não têm cor nem movimento,
Assim como as flores não têm perfume nem cor.
A cor é que tem cor nas asas da borboleta,
No movimento da borboleta o movimento é que se move,
O perfume é que tem perfume no perfume da flor
A borboleta é apenas borboleta E a flor é apenas flor.

Alberto Caeiro, Passa uma Borboleta

Regina Gouveia, 2017-01-04

1 A difração de uma onde consiste em contornar obstáculos como acontece, por exemplo, quando o mar contorna uma rocha que emerge e fica exposta na superfície.
2 Alguma informação sobre ondas eletromagnéticas, pode ser encontrada em http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/fisica/o-que-sao-ondas-eletromagneticas.htm






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