Espaço Associados

      

No Reino da Dinamarca

Por Miguel Boieiro

Agosto 2011

Foi dupla a experiência que adquirimos, se quisermos resumir e simplificar. Em primeiro lugar, aproveitámos a soberana oportunidade de participar, pela primeira vez, num Congresso Universal de Esperanto, magno evento que reuniu cerca de 1500 esperantistas oriundos de 66 países de todos os continentes. Tratou-se de um autêntico mergulho no futuro, por onde passará inevitavelmente a Humanidade na sua ânsia de se aperfeiçoar e progredir. A intensa programação foi rica e variada com múltiplos grupos especializados e espetáculos abordando temáticas que estão no cerne da natureza humana e visam alcançar patamares superiores de são inter-relacionamento em que a paz e a cooperação internacional surgem como expoentes humanistas. Para além das faustosas sessões plenárias de abertura e de encerramento, o Congresso, que decorreu de 22 a 30 de julho, sob o tema global "Dialogo kaj Interkompreno" (Diálogo e Intercompreensão), integrou encontros específicos que se desenvolveram livremente, sem quaisquer espécies de tabus. Eis alguns exemplos: política mundial, economia, finanças, ensino, cultura, jornalismo, etno-linguismo, ecologia, naturismo, medicina, cristianismo, uonbulismo, bahaísmo, budismo, ateísmo, amigos de Bruno Gröning, espiritismo, anarquismo, comunismo, partidos "verdes", vegetarianismo, nudismo, sexualismo, evolução do Esperanto na China, artes orientais, geminação de municípios esperantistas, ... Vejam só! Até surgiu um grupo intitulado "Kat-amikaro", ou seja, "amigos dos gatos".

Por tal lista de exemplos, longe de ser exaustiva, poderemos ficar com uma ideia da abertura e da amplitude temática sem peias de como decorreu o evento.

A filosofia esperantista é mais do que um veículo linguístico que agiliza a comunicação entre os povos, enredados numa insuportável babel, geradora das maiores confusões, de conflitos e de guerras. Como idioma neutro, isto é, não pertencente em exclusivo a nenhum país ou potência militar e/ou económica, o Esperanto torna-se o idioma adequado para tratar de todos os assuntos com rigor e simultaneamente com facilidade e flexibilidade. Isso mesmo vimos nós, e sentimos, no convívio amistoso com gente de todo o mundo e de diversos escalões profissionais, filosóficos, sociais e etários. Sobre o inesgotável potencial do E-o como língua internacional, muito haverá ainda por descobrir, congeminar, experimentar e planear. É claramente um instrumento do futuro ao serviço da Humanidade.

Em segundo lugar, a participação neste encontro, permitiu-nos conhecer mais detalhadamente as características de uma região, que, em determinados aspetos, marcha na vanguarda do desenvolvimento social, tecnológico e económico.

Tivemos ocasião, não só de visitar pormenorizadamente a cidade de Copenhaga, mas também de excursionar em áreas rurais com férteis campos de trigo, beterraba sacarina e colza. Conhecemos uma das antigas capitais do reino - Roskilde. Nesta cidade há um importante museu interativo sobre barcos Vikings, agregando diversas exposições, filmes e oficinas onde se demonstra, ao vivo, as técnicas de construção em madeira e ferro, da navegação na alta idade média e o modo de vida dos intrépidos navegadores nórdicos dos séculos IX e X. Eis uma verdadeira lição de História sobre a sobrevivência humana em condições climatéricas dificílimas. De realçar igualmente a visita à milenária catedral, recheada de túmulos monumentais dos ilustres de antanho.

Num "city-tour" por Copenhaga, usufruímos de um passeio de barco pelos canais que entrecruzam a parte antiga da cidade e visualizámos a célebre sereia, "ex-libris" de Copenhaga - afinal uma pequena estatueta pousada num rochedo à beira-mar, permanentemente rodeada de foto-turistas japoneses.

Subtraindo um precioso dia ao Congresso, optámos por um passeio à vizinha Suécia. Subimos em direção ao norte e em Helsingor atravessámos o estreito canal no Hamlet, luxuoso "ferry-boat" shakesperiano, até Helsingborg (parece o mesmo nome, mas em sueco). Viajámos depois pela encantadora província da Skane, que outrora fazia parte da Dinamarca, até Malmö (terceira cidade mais importante da Suécia). De caminho, parámos em Lund, urbe histórica onde almoçámos e visitámos outra soberba catedral medieval com ornamentados túmulos de reis e rainhas.

Malmö tem também muitos encantos. Havia uma feira ao ar livre com diversas atrações, sobretudo gastronómicas, jardins admiráveis e uma vista esplendorosa sobre a tão falada travessia ferro-rodoviária para Copenhaga, considerada a mais extensa da Europa. Tal travessia consta de uma ponte a lembrar a nossa Vasco da Gama, que depois assenta numa comprida ilha artificial e segue em túnel em direção ao aeroporto internacional, ele próprio também numa ilha, acabando depois na Grande Copenhaga.

Uma das coisas desagradáveis que sentimos nesta cidade nórdica foram as condições atmosféricas, mesmo no pino do verão. Choveu, esfriou e ventou praticamente todos os dias nesta derradeira semana de julho.

Outro pormenor (ou por maior) complicado é o custo de vida para quem vem do sul. É tudo caríssimo e nem pensar em ir a restaurantes. O jantar de convívio no início do Congresso custava a módica quantia de 65 euros por participante. É claro que, com muita pena, tivemos de faltar!

Os dinamarqueses são extremamente educados e cumpridores durante cinco dias por semana, mas às sextas-feiras e aos sábados extravasam-se em noitadas de bebedeira, bem patentes nos vomitados e no lixo que, nessas alturas, ultrapassa o que é habitual.

Por fim, uma breve nota sobre os transportes. À semelhança do que vimos no ano passado, na Rússia, também aqui os comboios e os metropolitanos são rápidos e pontualíssimos. Em cada estação o passageiro é avisado da chegada do transporte com intervalos de 30 segundos. Há carruagens onde é interdito fazer qualquer espécie de ruído. Outras destinam-se prioritariamente a recolher bicicletas que são omnipresentes em toda a cidade. Muitas estão estacionadas sem cadeados ou qualquer outro processo de prevenção contra roubos.

E eis, num breve relance, algumas anotações de um parco e descontraído viajante que, despreocupadamente, foi tomando notas, um pouco "à vol d'oiseau", como sempre faz quando as circunstâncias o permitem percorrer o mundo.

Miguel Boieiro associado da Unicepe - Porto
Agosto de 2011


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