Espaço Associados



       Educação: mais uma aventura?

Publicado em 2011-03-31, no PÚBLICO (pag. 38) e no I (pag. 3)



Os partidos da oposição aprovaram na Assembleia da República (AR) a suspensão do modelo de avaliação de desempenho (AD) dos professores. Se eu fosse professor, talvez exultasse de contentamento, dadas as críticas manifestas de que este e anteriores modelos AD têm sido objecto por parte dos professores.

Mas não sou. Sou pai e encarregado de educação (EE). E, por isso, supondo que a AD dos professores, tendo já sido sujeita a tanta análise e "trabalho científico" (é o que garante a srª ministra da Educação), tenho razões para ficar preocupado com (mais) esta suspensão política, visto que a AD é, deve ser, em qualquer organização (e muito especialmente na Escola), um factor de exigência profissional no sentido da qualidade do trabalho, de responsabilização e de reconhecimento do trabalho dos professores. E também, até por essa via, um instrumento de planeamento e desenvolvimento organizacional, de coesão profissional, um suporte da melhoria da qualidade da produção e dos serviços, neste caso do serviço público Ensino. O problema essencial que se coloca aos pais dos alunos, como tal e como cidadãos (e não como analistas políticos) não é a eventual inconstitucionalidade da "aventura" político-jurídica desenrolada na AR.

A preocupação dos pais decorre, isso sim, do facto de dirigentes de dezenas de escolas públicas denunciarem sistemática e publicamente a AD dos professores como "altamente lesiva da escola pública", porque fomenta a "competição desgovernada", "cria profundas divergências entre professores da mesma escola" e, pela burocracia do processo de aplicação, "rouba aos professores muito do tempo necessário para ensinarem".

Ora, se assim é, este modelo de AD é, afinal, contraproducente. Não só quanto ao bom trabalho dos professores mas, mais, quanto aos direitos e interesses dos pais, EE e cidadãos em matéria de qualidade do ensino. E, então, é absurdo que o Ministério da Educação (ME) mantenha (também) este modelo de AD, fomentando "profundas divergências entre professores da mesma escola", com o risco de diminuir a entreajuda e dificultar a socialização de conhecimentos e práticas, a cooperação, articulação e coordenação frutífera das actividades educativas e, assim, de prejudicar a coesão e desenvolvimento organizacional da Escola e, logo, a qualidade do ensino.

Por um lado, os pais e EE têm motivos para se preocuparem quando os directores escolares e os professores dizem que a aplicação deste modelo de AD é "altamente lesiva da escola pública". É que isso indicia que, para verem o seu trabalho "avaliadamente" reconhecido, correm o risco de nele não se reconhecerem.

Por outro lado, preocupa-os também a denúncia, sempre repetida, de que o processo da AD, pela "burocracia e perda de tempo que implica", não os deixa "serem professores", o que indicia que, afinal, (também) este modelo de AD prejudica o que é a essência do "desempenho" a avaliar, que é ensinar. Parece que o problema continua a ser não só a avaliação de desempenho mas, também, ... o "desempenho" da avaliação. Mas, então, perguntam-se os pais e EE, os cidadãos, há pouco mais de um ano, este modelo de AD não foi considerado pelos sindicatos "um bom acordo" e pela srª ministra da Educação e sr. primeiro ministro uma "vitória política"? Ou será que isso, então, não passou de (mais) "uma aventura" educativo-política e, agora, esta suspensão da AD dos professores de (mais) "uma aventura" político-educativa?


João Fraga de Oliveira, Santa Cruz da Trapa