Outono. O sol brilha nestes radiosos dias de fim de Outubro.
Contudo, no estado de espírito, resta uma certa sensação de paradoxo.
Talvez Ortega y Gasset explicasse isso, lembrando-nos que o "Homem é ele e a sua circunstância". Talvez.
É que, de facto, as "circunstâncias", "não as podendo nós ignorar", pelo que delas "vemos, ouvimos e lemos", mau grado a consciência da maravilhosa realidade da Natureza, induzem-nos um sentimento de "enevoeiramento" depressivo. Em que se misturam vários conceitos antinaturais (ou, serão sobrenaturais?) como "os mercados" e rating, siglas repetidas e indecifráveis (ou, pelo menos até agora, inexplicadas) como PEC, PEC, PEC (três vezes, como nas orações), "curvas", "gráficos", inúmeros números, recorrentes apelos a "sacrifícios" feitos por velhas e novas cassandras e manhosos velhos carrascos bem tratados, relações esquisitas (ou talvez não, quem sabe?...) entre figadais "inimigos" que, poderóticos, do mesmo são amigos.
Este sentimento de nevoeiro adensa-se com silêncios que quase se "cortam à faca". Silêncios de quem, por medos e mais medos, mais "enevoeirado" tem sido. Mas, também, com prolongados silêncios calculados e calculistas, cínicos.
A progressiva acentuação deste deprimente sentimento de "enevoeiramento" indefinível (apesar de a definição ser possível) exige que espairecemos. Que aproveitemos estas radiosas tardes (também podem ser as manhãs) de Outono (que talvez se prolonguem para Novembro) e, na Natureza (campos, praças, ruas), "venhamos para a rua gritar" (e cantar), colectivamente, em uníssono, o que, antes e depois do "nevoeiro", sempre, é a essência, é o mais natural da Natureza: o Homem, nós próprios, as pessoas. Como tal. Desenevoadas.
Ou será que, como há séculos, vamos ficar à espera que, numa manhã (talvez agora numa tarde) destes dias de "nevoeiro", alguém, um rei ou um general, quiçá um professor, sebastiânico e esfíngico mas especialista em "nevoeiros", venha de Ceuta (talvez agora de Belém), outra vez, "salvar-nos" com uma cura de ...mais "nevoeiro(s)"?
João Fraga de Oliveira, Santa Cruz da Trapa