“Não haverá aumento de impostos”. Na apresentação do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC), foi o Primeiro Ministro (PM) quem proferiu estas palavras.

E, como se sabe (Foucault explicou bem isso), há uma relação íntima entre as “palavras e as coisas”. Sim, porque, se as coisas fazem palavras, as palavras fazem coisas.

Mas, dir-se-á, afinal não é tanto assim. De nada valem estas palavras do PM, pouca coisa fazem, porque – todos já sabemos – por causa do tal plafond das deduções, vamos pagar mais impostos.

Portanto, pelos vistos, aquelas palavras do PM têm, afinal, uma “face oculta”. Ao afirmar que, formalmente (nominalmente), “não haverá aumento de impostos”, o PM oculta-nos que, informalmente, vamos (realmente) pagar mais impostos.

Porquê? Não havia necessidade! Afinal, como escreveu Wittgenstein, “tudo o que pode ser dito, pode ser dito claramente”.

É claro que todos sabemos que na real politik nem “tudo pode ser dito” e que o “formal” não passa de uma “realidade” “política” (aspas nas duas) que nos oculta a (“informal”) realidade real.

Mas (também) isto é prejudicial para a nossa estabilidade. E, como nos repetem até à exaustão o Governo, “observadores externos”, especialistas e comentadores (sobretudo, os “residentes”), sem “estabilidade” não há “crescimento”.

Sejamos optimistas (até porque é com optimismo que se criam postos de trabalho). Pode ser que a “estabilidade” do PEC não tenha nada a ver com a estabilidade de cada um de nós, contribuintes, cidadãos, pessoas. Talvez até seja a nossa instabilidade que garanta a “estabilidade” do PEC. E esta é que – dizem-nos os tais “observadores externos” – é importante.

Sejamos ainda mais optimistas. Tenhamos esperança de que, por trás da sigla, “formal”, do PEC, o Governo (com a ajuda da Comissão da EU), nos esteja a ocultar (também) a grata surpresa política (esta sim, sem aspas) de um verdadeiro PCE, um real, ainda que “informal”, Programa de Crescimento para a Estabilidade.


João Fraga de Oliveira, Santa Cruz da Trapa