Espaço Associados



       Se o Magalhães fosse pessoa!

PÚBLICO (“Cartas à Directora”) -09/03/2010 –pag. 38



Leandro Pires, aluno do sexto ano, da Escola Luciano Cordeiro, em Mirandela, saiu da escola à hora do almoço e atirou-se ao rio Tua.

Este comportamento, parece não haver dúvida, está relacionado com maus tratos físicos e psicológicos de colegas de escola.

A discussão tende muito a cristalizar-se no rótulo da situação, se esta é, ou não, um caso de bullying.

Mais importante do que isso é saber se é ou não um problema de Educação.

Os “especialistas” avançam explicações de toda a ordem: individualizantes e psicologizantes (adolescência, sentimentos, medos, receios, complexos das crianças); familiares (famílias “destruturadas”); socioculturais (origem e contexto social “fora da escola”); policiais (falta de policiamento); judiciais (atraso nas decisões de várias dezenas de processos accionados pelo M.P.), etc.

As “receitas” de resolução, naturalmente, passam muito por essas análises: palestras, repressão, celeridade dos tribunais, punição dos alunos e das famílias (brada aos céus ouvir o presidente da CONFAP defender a o “castigo” de pais de alunos com a retirada de apoios sociais que lhes tenham sido atribuídos), etc.

Claro que temos que admitir que, no limite, esta é uma questão que tem causas multifactoriais e que, por isso, todas as contribuições, venham de onde vierem, terão algo de positivo.

Mas, essencialmente, esta é uma questão de Educação e, mais nuclearmente, da Escola.

É sobretudo à Escola que é exigível que, no seu específico condicionalismo escolar, organizacional, humano e social, seja autónoma e esteja preparada para detectar, caracterizar, resolver, acima de tudo prevenir, situações desta natureza.

Isso requer, desde logo, meios, pessoas, informação, formação, organização. E, mormente, cultura organizacional em que, tendo em conta as especificidades e aleatoriedades que os caracterizam, na Escola, seja o humano e o social que preponderem.

Pelo que veio a público, fico na dúvida se, na (pela) Escola, de algum modo, não faltou ao Leandro e aos seus colegas agressores, ajuda e intervenção oportuna, empenhada, diligente, continuada, rigorosa, disciplinada(ora), qualificada e integrada de uma “velha tecnologia” : a(s) pessoa(s).

Mas a pessoa (aluno, professor, técnico, funcionário, pai), como conceito essencial de referência da Escolmamente nesta sido muito feito esquecer pela desumanização do “eduques”, do empresarialismo, do avaliacionismo, da burocracia da tecnocracia, das “novas tecnologias”.

Volto a um desabafo simbólico que, há dois anos, já expressei: “Se o Magalhães fosse pessoa!”


João Fraga de Oliveira, Porto