Espaço Associados



       Pelos milhões, chutar, chutar

PÚBLICO -04/09/2009-pag.36



“É uma questão estrutural na área específica da finalização”.

Com esta frase, racional e racionalizante, está-se a falar de quê? Do acabamento, na produção de panelas de pressão? De um supermercado e da importância das(os) operadoras(es) caixa?.

Nada disso. É o seleccionador nacional de futebol, corroborado pelo presidente da FPF, a propósito da contratação de (mais) um estrangeiro, Liedson, para a selecção portuguesa de futebol. Com o que, indo directo ao assunto, estou em desacordo.

Não por azedume pseudo “intelectual” contra o futebol, de que sou adepto. Muito menos por qualquer facciosismo clubístico.

Respeito muito e, por princípio, considero benvindos todos os imigrantes (e muito especialmente os brasileiros). Neste aspecto, a minha posição resumiu-a já Mia Couto: se um país tem muitos homens, um homem tem muitos países. Só que – salta aos olhos, pelo tempo e modo como foram feitas – esta e outras contratações para a selecção não se integram no conceito humano, social, ideológico, de imigração. O que lhe subjaz é, apenas, a mercantilização que do (no) futebol impera, os interesses dos milhões que aí estão implicados.

Houveram, claro, as convenientes “naturalizações” (ou “aquisições de nacionalidade”). Mas, neste campo, o que, para mim, caracteriza o “nacional” das selecções não é a legalidade da “aquisição” da nacionalidade mas a genuinidade desta.

E quanto à racionalização produtivista, mercantil e tecnocrata destas situações, ainda para mais num campo tão pouco racional como este é, até o principal mentor teórico da “racionalidade” reconheceu os absurdos onde nos podem levar os seus excessos.

Por exemplo, ao absurdo contraste entre este tipo de contratações e as bandeirinhas nacionais “de” Scolari.

Ou ao de uma selecção “nacional” de onze (ou mais) não nacionais, ainda que com “nacionalidade adquirida”.

Ou, ainda, ao de vermos brasileiros constrangidos a cantarem “(...) contra os canhões, marchar, marchar”, quando o que para eles (e nós) é natural é que cantem ”(...) pátria amada, Brasil!”.

E tudo porque só foram contratados para a selecção para, pelos milhões, chutar, chutar!.


João Fraga de Oliveira - Porto