2020-06-17



Risoleta C Pinto Pedro


O seu a seu dono



      «O Messias virá, diz o Talmude, quando, de cada vez que uma referência é dada, for recordado o nome daquele a quem se deve a referência.»



      “Prefácio” in: A Cabala e a Tradição Judaica,
      René de Tryon-Montalembert e Kurt Hruby
      Ed. 70, Colecção Esfinge, Lisboa, 1979.



Apesar de ter o cuidado de não o fazer com outros, nunca me preocupo que me copiem, me imitem ou citem sem referir a fonte. Por várias razões. Primeiro, porque estou persuadida de que aquilo que fazemos não nos pertence totalmente, que somos, de alguma forma, um canal. Diz Pessoa, talvez não exactamente neste sentido, mas agora dá-me jeito usá-lo no sentido que me apetece: «Tudo o que sonho ou passo,/ o que me falha ou finda,/ é como que um terraço/ sobre outra coisa ainda./ Essa coisa é que é linda.»

O que é lindo é a ideia original e inacessível que pretendo criar com as palavras, sem que essa impossibilidade, contudo, me faça desistir. Porque existe uma coisa linda sobre a qual as palavras se debruçam e que vale a pena perseguir. Isso é a arte. Portanto, o que o imitador imita é apenas a pálida sombra que outro captou, que já era uma sombra. É pobre. É pouco exigente, contenta-se com pouco. Valia mais buscar, por si, a tal coisa linda que existe e por mais inacessível que seja, quer ser colhida.

Portanto, aquele que imita é um pobre sem abrigo persuadido de que não consegue fazer melhor por si. Logo, um ser digno de lamento, não de acusação.

Segundo, se o que criei é tão apetecível, significa que estou no bom caminho.

Terceiro, as acções, boas ou más, ficam com quem as pratica.

Quarto,, a coisa não se esgota. Onde fui buscar aquilo há mais, muito mais, não preciso de ficar agarrada ao que fiz, o método é seguir em frente e libertar o que ficou para trás. E os que ficaram para trás agarrados ao que fizemos e que já não é a nossa prioridade.

Há mais razões para não recear o plágio, a nem sequer (esta crónica é a excepção) pensar nisso, tantas quantas aquelas que, ao contrário, me levam a ter cada vez mais cuidado em citar as fontes. E esta está na epígrafe, a passagem do Talmude com que iniciei esta crónica:

«O Messias virá, diz o Talmude, quando, de cada vez que uma referência é dada, for recordado o nome daquele a quem se deve a referência.»

Concordo, mas estou consciente que não entendo totalmente, em toda a sua profundidade, o teor da afirmação.

Deixo-o, caro leitor, com o mistério que eu própria não consigo decifrar, por ser demasiado ignorante para o fazer. Mas é possível gostar de algo que não se compreende, acabo de descobrir.


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